Quem é Vladimir Putin?
“Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és” – sim, está bem, essa é fácil, já conheço. “Diz-me o que falas, dir-te-ei quem és” – só se falas verdade; e a única verdade é que nunca falas verdade. Diz-me, então, o que fazes e dir-te-ei quem és. E, se me disseres o que fazes a outros, dir-te-ei mesmo quem és. É absolutamente certo que é pelos actos sobre outros que revelas o teu carácter.
Lembremos,
por exemplo, Prigozhin. Líder do Grupo Wagner, exército privado às ordens da política
externa do Kremlin, um senhor da guerra servidor leal de Putin, com extensa
acção em África, envolveu-se também na linha da frente da invasão da Ucrânia. Os
seus mercenários participaram na violenta batalha de Bakhmut, que durou mais de
10 meses.
Depois de
muitas críticas às chefias militares russas, Prigozhin faz
um movimento de revolta, em 24 de Junho de 2023, que acabaria por travar,
aceitando um acordo. Pareceu que não iria durar. E não durou: a 23 de Agosto,
pudemos ver o avião de Prigozhin, a rodopiar em queda rápida até se esmagar no
solo. A ocorrência de atentado pareceu evidente. Morreram 10 pessoas: sete
passageiros (Prigozhin e outros do Grupo Wagner) e três tripulantes.
Quem mata
assim um dos seus? Quem é que, para matar um dos seus, faz matar mais nove com
ele? Quem mata assim dois pilotos, alheios ao Grupo Wagner? Quem mata assim também
uma hospedeira? Sim, Yevgeny Prigozhin era um assassino. Mas assassino que mata
assassino tem 100 anos de perdão? Não tem, sobretudo quando Putin era o próprio
chefe e beneficiário de Prigozhin e dos seus actos de política e de guerra. O
patrão carrega 10 vezes a culpa do mandatário.
Lembremos,
agora, Navalny, advogado, o mais destacado opositor político de Putin. Nunca
pegou em armas, nem o incitou. Desde 2000, usava unicamente a sua voz e a sua
coragem física e moral. Tentava ir a eleições justas, ao que várias vezes foi
barrado. Liderou o partido Rússia do Futuro (2018), antes Partido do Progresso
(2014) e, antes ainda, Aliança do Povo (2012), banido pelo Kremlin em 2021. Denunciava
frontalmente a corrupção do regime. A partir sobretudo de 2011, começou o jogo
do gato e do rato entre Putin e Navalny. Perseguição contínua e crescente,
incluindo manipulação de processos judiciais. Em 2020, é envenenado com Novichok,
um veneno do arsenal da gente de Putin. Busca tratamento na Alemanha e
salva-se. Regressa à Rússia, em 2021, sendo logo aprisionado. O cerco aperta. Inventam-lhe
acusações criminais e acumula penas. Muda de cadeia em cadeia. A partir de 15
de Dezembro de 2023, ninguém sabe dele. “Aparece” a 25 de Dezembro numa região
gelada do Ártico, na colónia penal IK-3, “Urso Polar”, de regime severo. A 16
de Fevereiro de 2024, é divulgado que estava morto. Depois de morto, Putin
ainda chantageou a família e negou-lhe o corpo por alguns dias. Alexei Navalny
manteve sempre o ânimo alto e o bom humor diante da perseguição, muitas vezes
brutal. Putin não o suportava. Como se atrevia? Ordenou caçá-lo e matá-lo.
Há ainda o
caso de Kaja Kallas, primeira-ministra da Estónia. Não foi morta. Mas o Kremlin
colocou-a, em Fevereiro passado, na “lista dos mais procurados” pela justiça do
regime de Putin, por uma acusação que é todo um programa político imperial. Kallas
é acusada de “ao mandar retirar dos espaços públicos da Estónia monumentos aos
soldados soviéticos da Segunda Guerra Mundial”, o que foi considerado “um
ultraje à memória histórica”. Vejam bem! Uma primeira-ministra de um país soberano
a governar o seu país sem pedir licença! Como pode admitir-se que a senhora
repudie as tropas que, em 1940, ocuparam o seu país graças ao acordo
Hitler/Estaline, o tristemente célebre Pacto Molotov-Ribbentrop? Putin é o fiel
guardião da memória nazi e comunista, a Europa a ferro e fogo.
O recente
ataque terrorista de 22 de Março ao Crocus City Hall, em Moscovo, que provocou
140 vítimas mortais e 550 feridos, fornece o último e mais imprevisível
exemplo. Apesar da guerra desencadeada por Putin contra a Ucrânia em 2022, o
Ocidente mostrou total solidariedade contra o terrorismo. Rapidamente se
ouviram as condenações e condolências de todo o mundo. E os EUA havia, umas
semanas antes, prevenido publicamente e em privado quanto à possibilidade de um
ataque destes. Putin, que sabe tudo, descartou o alerta com soberba.
Toda a gente
sabe que foi um comando do Estado Islâmico, do grupo Isis-K, que opera no
Azerbeijão e Tadjiquistão. O atentado foi reivindicado. E foram capturados
quatro terroristas tajiques, já exibidos perante o tribunal, “devidamente”
torturados e sovados. Putin, porém, aplica-se desde o primeiro dia, num
laborioso tricot, a cuspir insultos e calúnias, enquanto tenta fabricar
uma culpa da Ucrânia e do Ocidente. Tem vergonha do seu desleixo. Monta-se no
terrorismo assassino para alimentar o ódio e a ucranofobia e dar gás à sua
guerra.
De todos
estes casos, fica a pergunta: como é possível, nos dias de hoje, o mundo
tolerar que esteja sentado no Conselho de Segurança das Nações Unidas, como
membro permanente, um Estado chefiado por um Presidente deste calibre? Estão a
troçar da Carta das Nações Unidas e da Declaração Universal dos Direitos do
Homem. Putin, os que o acompanham e os que se conformam.
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