"Euronews": ganhar uma batalha ganha
Quando Portugal entrou no projecto Euronews, em 1999, talvez não nos déssemos conta da importância estratégica desse passo. Embarcámos com a nossa língua na nave europeia da comunicação à escala global. E tornámo-nos passageiros da viagem fundamental para o nosso futuro.
Qual é, de facto, para nós, portugueses a viagem fundamental para o nosso futuro? É termos existência própria e forte identidade no mundo da globalização, isto é, sermos uma das referências da nova era e não apenas um átomo diluído na multidão.
Fomos a sexta língua do projecto; e até isso tem uma forte carga simbólica na competição linguística europeia. O Euronews arrancara, em 1993, com apenas aquelas cinco línguas que, no jargão da União Europeia, baptizam o chamado “regime de Alicante”: Inglês, Francês, Alemão, Espanhol e Italiano. Juntámo-nos para não nos deixarmos atrasar; e, na verdade, demos aí um enorme passo em frente. A nossa adesão assinala, por um lado, a vontade de não sermos relegados para uma segunda divisão das línguas europeias. Mas, por outro lado, foi mais do que apenas isso – foi um crucial passo em frente na afirmação da nossa verdadeira vocação: o Português, língua da Europa.
Na verdade, dessas seis línguas europeias, a língua portuguesa nem é sequer apenas a sexta – é, como várias vezes sublinho, a terceira: a terceira língua europeia global, a terceira língua europeia com mais falantes em todo o mundo como língua oficial. Se, agora, quando o Euronews voa em acelerada velocidade de cruzeiro, já com onze línguas em simultâneo e mais a preparar-se para aderir, Portugal se apeasse da viagem comum, isso não seria apenas o regresso a uma cinzenta segunda divisão, mas o mergulho numa terceira divisão onde nos apagaríamos de vez.
O Euronews é uma extraordinária história de sucesso, europeia e mundial. Antes de fazer vinte anos, já está na linha da frente da informação mundial. Canal preferido de informação internacional na Europa e na África e Médio Oriente, é também o n.º 1 nas escolhas das elites mundiais.
As chaves desse sucesso são, a meu ver, cinco:
1. O multilinguismo do canal, que o torna acessível na própria língua a mais de metade da população mundial. Sabia, por exemplo, que estudos demonstram que, mesmo no meio selecto das elites, apenas 39% se satisfazem com uma informação unicamente em inglês?
2. O grande apuro e agressividade no plano tecnológico, sendo acessível na televisão hertziana, por cabo e por satélite, bem como já nos telemóveis, smartphones e tablets, e completado por um dinâmico portal Internet, actualizado em contínuo e igualmente multilingue, que chega a todo o lado e por todas as plataformas. O Euronews está nas nossas casas, também nos hotéis e aviões de grandes companhias, e sempre à mão; está nos televisores, nos computadores de mesa, nos laptops, nos telemóveis de mão, nos iPad, nas aplicações Androïd, em tudo o que mexe nas modernas tecnologias de informação.
3. O formato estável por blocos noticiosos certos de meia em meia hora, embora com conteúdos variados ao longo do dia, 24 horas por dia, 7 dias por semana. É informação global, internacional e multilingue, à hora certa.
4. A equipa redactorial multinacional, que não assegura apenas a emissão em diferentes línguas, mas também uma cobertura mais global de conteúdos, agendas, ângulos e sensibilidades.
5. Grande economia de recursos e enorme eficiência orçamental: com um orçamento igual a somente um décimo da CNN, bate-se de igual para igual e tem audiências largamente superiores nos espaços onde lidera – por exemplo, na Europa, tem oito vezes mais espectadores que a CNN.
O Euronews é já uma batalha ganha. E o serviço de língua portuguesa é parte dessa vitória. Só na distribuição televisiva mundial, o Euronews chega a 350 milhões de lares, com a emissão portuguesa assinada por 100 milhões de lares. Está presente nos cinco continentes, com largas dezenas de milhar de assinantes na Europa, na América do Norte e na África/Médio Oriente e enorme potencial de crescimento na América Latina e na Ásia/Oceania, regiões mundiais onde a língua portuguesa tem préstimos a oferecer e fortes interesses a defender e afirmar.
A pequena equipa de língua portuguesa (33 jornalistas, entre residentes e precários) não assegura apenas as mais de 8.700 horas de emissão em contínuo e os conteúdos em português do portal Internet. Mas garante também a presença, em todas as línguas do canal, de conteúdos variados de matriz portuguesa e lusófona difundidos para todo o mundo. O Euronews é o rosto informativo da Europa em todo o mundo. É informação europeia de qualidade, em permanência, para os portugueses, compartes da construção europeia. E é também, viajando na nau comum, um pouco de Portugal no mundo inteiro. O apagão português seria um recuo colossal, um desastre inaceitável.
O serviço português custa, hoje, à RTP menos de 2 milhões de euros por ano. É, sem dúvida, uma das suas missões de serviço público. E, havendo porventura dificuldades por causa da crise actual, importa não descurar as conhecidas alternativas de repartição de custos. Mas, em definitivo, é barato como custo e investimento: trata-se de 1/3 do que pagam os novos que entram no projecto; e, calculando sobre o número de lares a que a emissão portuguesa chega actualmente, o esforço português é de apenas 2 cêntimos de euro por cada lar onde, em todo o mundo, chega informação europeia internacional na nossa língua.
Por isso, a verdadeira questão quanto ao Euronews e ao seu serviço de língua portuguesa é esta: pode Portugal perder uma batalha ganha? Não. Só podemos continuar a ganhar a batalha que já foi ganha. Só podemos continuar a querer ganhar um projecto ganho e em crescente afirmação global.
Nesta luta, duas alegrias para já: a primeira, ver Timor-Leste a defender este serviço mundial em português; a segunda, ter conseguido da Comissão Europeia a abertura suficiente para socorrer as dificuldades financeiras do Estado português, abrindo-se a apoiar a continuidade do serviço de língua portuguesa.
Não é tempo de partir. É tempo de continuar, de aproveitar melhor – e de colher.
José Ribeiro e Castro
Deputado do CDS-PP
Presidente da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura
Ex-líder do CDS
Presidente da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura
Ex-líder do CDS
DIÁRIO ECONÓMICO, 16.Janeiro.2012
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