Olentejo, de Odemira a Olivença
Ao iniciar colaboração regular na MAIS ALENTEJO, devo explicar a razão de ser do título da minha coluna: "Aquém-Guadiana". Irei escrever de uma perspectiva alentejana do lado de cá do Guadiana, querendo juntar, agregar e unir com o lado de lá da nossa ilharga oriental.
Sim, eu sei que o Alentejo não está todo do lado de cá do Guadiana. Sabemos que o Norte Alentejano, de Elvas para cima, até Niza, se vai afastando desse nosso braço que vira para Espanha, na Extremadura, por Badajoz e Mérida. Sabemos que há municípios alentejanos na margem esquerda, como Serpa, Moura e Barrancos, Mourão mais a norte, meia Mértola a sul. Mas há esse outro Alentejo menos conhecido, semi-encoberto, o de Olivença e Táliga, onde foi fundada a "Além-Guadiana" a que quero referir-me como par.
Há dias, contei-o na minha última intervenção na Assembleia da República:
"Foi há poucos anos que conheci uma Olivença diferente, através dos oliventinos. Conheci a “Além-Guadiana”, associação de direito espanhol, que desde 2008, com visão e generosidade, desenvolve trabalho notável de revitalização da matriz portuguesa em Olivença e Táliga e promove um pujante ideal de biculturalidade. Tem-no feito com as autoridades regionais e municipais, que participam desta visão e a apoiam, dando-lhe expressão. Hoje, em Olivença, vê-se calçada portuguesa; e, na toponímia do belíssimo Centro Histórico, todas as praças, ruas e travessas, exibem o nome actual espanhol e, em impecável azulejo, o correspondente nome antigo português.
As raízes lusas são orgulho oliventino, que guarda admirável património monumental português, sinal de uma História rica que mergulha fundo na nossa expansão marítima, de Ceuta à Descoberta do Brasil. O trabalho da “Além-Guadiana” não tem paga possível. Expresso o reconhecimento a “Os Três Mosqueteiros” da biculturalidade e do bilinguismo, que, aqui, também são quatro: o Joaquin Fuentes Becerra, o Eduardo Machado, o José Antonio Gonzalez Carrillo (o escritor do grupo) e o D’Artagnan, que é mulher e artista, a Raquel Sandes Antunez.
Esta Olivença, por que me apaixonei (“Olivença, meu amor”), é uma terra única, absolutamente singular: “a nossa pequena Alsácia”, como digo, na raia de Portugal e Espanha. São essa ambiguidade, essa dupla pertença, esses traços simultaneamente espanhóis e portugueses, que fazem Olivença diferente de tudo o resto e inconfundível – essa é a sua marca, o seu capital. No fundo, não é de estranhar que, olhando toda a História peninsular, pudesse haver, quanto a Portugal e Espanha, um lugar em que a fronteira não é fronteira, em que a fronteira não é uma linha tangente, mas linhas secantes dos dois, uma fronteira que, em vez de separar, abraça e reúne.
Há! Esse lugar é Olivença, a celebrar os quinhentos anos do Foral de D. Manuel I: uma terra também alentejana, como podemos perceber junto ao Guadiana, defronte de Juromenha, ou na aldeia de São Jorge da Lor, cujas dezenas de chaminés não enganam – olhando-as, ouvimos o sotaque do Cante."
Aquém Guadiana é a resposta do lado de cá: o abraço de irmãos e de amigos a outros irmãos e amigos que não nos esquecem.
As minhas raízes são Odemira, minha casa, terra de minha mãe e minha avó. Sonho com o dia em que consigamos realizar, todos os anos, um Prémio Odemira-Olivença em ciclismo, ora num sentido, ora no outro, por Aljustrel, Beja, Reguengos, Alandroal, Borba e Elvas: 277 quilómetros simbólicos a selar a identidade, um sonho a realizar. Vamos a isso?
José Ribeiro e Castro
Advogado
MAIS ALENTEJO, 1.Agosto.2015
Crónicas "AQUÉM-GUADIANA"
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