O poder na ponta da caneta


A frase original é de Mao Tsé-Tung: “O poder está na ponta da espingarda.” Mas não é da revolução armada, do poder pela violência, da intimidação, que falamos. É do exercício da cidadania, da normalidade democrática, da escolha livre, informada e consciente pelos eleitores. Para o exercício da democracia, o essencial está nesta frase: “O poder está na ponta da caneta.”

É essencial que, em cada eleição, os eleitores – cada eleitor, na solidão individual da sua consciência – tenham a oportunidade de escolher quem os vai representar. É fundamental que os eleitores, quando entram na cabina de voto e marcam a sua escolha, estejam verdadeiramente a escolher os seus representantes ou, ao menos, a influenciar essa escolha – isto é, ao marcarem cada cruz no boletim, vejam o poder na ponta da sua caneta.

O nosso sistema eleitoral para as eleições legislativas – representação proporcional pelo voto em listas fechadas plurinominais – foi-se degradando progressivamente, à medida que os aparelhos partidários dele se apoderaram por inteiro. Hoje, são cada vez menos os que se sentem representados. O sistema permite-nos escolher entre partidos, mas não as pessoas – e a cidadania, pela decadência do funcionamento da generalidade dos partidos, deixou de influenciar a própria escolha dos candidatos. Os cidadãos eleitores nem têm o poder de escolher, nem a possibilidade de influenciar: os partidos é que tudo escolhem. Por isso, os portugueses votam cada vez menos: aperceberam-se de que a ponta da sua caneta para pouco ou nada serve.

É imperativo restaurar na democracia a confiança que foi quebrada, estabelecendo um vínculo efectivo entre o voto de cada eleitor e a representação parlamentar. Como fazer? Esse vínculo corresponde a os eleitores poderem escolher individualmente, em proximidade, os deputados que representam diferentes territórios do país. Isso, sim, é poder de escolha. E, ao fazerem isto, os eleitores adquirirem também, de modo implícito, o poder de influenciar a composição das listas por onde são eleitos outros deputados. Ou seja, os partidos deixam de concentrar a totalidade do poder e regressam à genuína função instrumental de ajudar a escolha pelos cidadãos. É essa a consequência do sistema misto de representação proporcional personalizada para que a APDQ e a SEDES, numa petição subscrita por 7.000 cidadãos, convidaram a Assembleia da República. A proposta está aí. É possível, é fácil, é justa.

É disso que precisamos: democracia, em vez de partidocracia.


José Ribeiro e Castro
Advogado, ex-líder do CDS
Presidente da APDQ - Associação Por uma Democracia de Qualidade

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