E se pudéssemos confiar


Já se ouvem os tambores da campanha para 6 de Outubro. E há nítidos sinais de desinteresse geral, quando tantas questões reclamam que nos envolvêssemos.

O principal continua a ser o crescimento económico, sem o que continuaremos a cair na escala comparativa com os parceiros da União Europeia, o emprego continuará incerto e o nível de vida não progredirá como o dos outros. Há dias, o Fórum para a Competitividade assinalava: “Em Portugal, no 2º trimestre de 2019, o PIB estabilizou nos 1,8%. Este nível de crescimento continua a ser muito baixo, muito mais fraco do que os países da UE com o nosso nível de desenvolvimento. Destaque-se o caso da Hungria (5,1%) e da Polónia (4,1%), que estão em vias de nos ultrapassar, com resultados muito superiores aos nossos. Neste grupo, pior do que Portugal, só a Grécia. Crescer menos que a Espanha (2,3%) é incompreensível.” Temos um sério problema social que se arrasta e é também travão económico: 20% dos portugueses abaixo do limiar da pobreza – uma chaga que envergonha. Falamos muito do interior, mas nada fazemos a sério. Os serviços de saúde sofrem de crise profunda, enquanto nos entretêm com esquisitices ideológicas. Tantas outras coisas sobre que mobilizar-nos.

Mas os partidos oferecem-nos mais do mesmo. A crise de confiança cavou-se. Já não se pergunta só: em quem votar? – o que é normal. Pergunta-se: para quê votar? Não nos deixam escolher também deputados, mas só partidos. E, com esta cegueira, perdemos confiança nos deputados e nos partidos também.

O sistema eleitoral, por que nos batemos na APDQ na SEDES, é o sistema português, como tenho procurado explicar, pois resulta, desde 1997, do art.º 149º da Constituição. O sistema alemão é o que mais se aproxima. Daí a pergunta que devemos fazer aos partidos: por que têm os alemães mais direitos que nós? Por que somos menos? Por que podem os alemães escolher partido e deputados e nós apenas podemos escolher partido e nenhum deputado?

Se o que defendemos já estivesse em vigor, os partidos teriam apresentado os seus candidatos em todo país, de que 105 seriam individualmente candidatos a 105 círculos uninominais de cerca de 90.000 eleitores cada. Por exemplo, Aveiro, Coimbra, Leiria e Viseu teriam o seu deputado – e a sua específica disputa eleitoral. Os partidos teriam esses 105 elos de proximidade em todo o país, enraizando o debate, convocando à participação e construindo a confiança. Só um ganharia, mas todos se empenhariam com o seu melhor, pois quereriam valorizar a imagem e o crédito. Os resultados finais seriam rigorosamente proporcionais como hoje, reflectindo as votações distritais; mas quase metade dos deputados seriam eleitos dentro da quota distrital do seu partido, porque, vencendo em círculo uninominal, conquistariam precedência. Teríamos um Parlamento realmente nosso. Teríamos na Assembleia da República verdadeiros representantes dos cidadãos eleitores, em vez de representantes dos chefes ou das cliques dos partidos.

Partidos há em que os candidatos elegíveis são todos, sem excepção, escolha individual do líder partidário ou do restrito núcleo dirigente. Todos os outros, com envolvimento local, são apenas enchumaços: preenchem as listas até aos 230.

A confiança nas eleições foi-se perdendo por este declive. Daí ser indispensável a reforma. É vital para a democracia, para a cidadania, para Portugal. Se já pudéssemos confiar, seria outro Portugal.



José Ribeiro e Castro
Advogado, ex-líder do CDS
Presidente da APDQ - Associação Por uma Democracia de Qualidade

DIÁRIO DE LEIRIA
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6 de Setembro de 2019

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