O que não se passou no dia 20: o futuro da democracia em Portugal
No passado 20 de Dezembro, alguns partidos tiveram a oportunidade de acertar o passo com a História e abrir caminho à reforma eleitoral: legislar o poder de os cidadãos escolherem e elegerem os seus deputados, sistema novo a que a Constituição abriu a porta em 1997. Ia ser discutida a Petição n.º 589/XIII/4, de que sou o primeiro subscritor, em nome da APDQ e da SEDES, que a lançaram – entrou na Assembleia da República com 6.813 subscritores, tendo subido para 7.970 até aquele último dia.
Três partidos houve a que não foi dada a palavra: o Chega, a Iniciativa Liberal e o Livre. Nos termos do Regimento, os partidos de um só deputado cada não podem intervir nos debates de petições em plenário. Poderiam ter torneado esta dificuldade: bastaria que tivessem apresentado um projecto de lei ou de resolução sobre a matéria da petição, mesmo com conteúdo minimalista – teriam de ser discutidos com a petição e, nesse caso, até votados. Aí, os deputados desses partidos também poderiam ter marcado a sua opinião. Mas, por inexperiência ou desconhecimento desta possibilidade, ou por o não terem querido, não tiveram voz.
Desde a revisão constitucional de 1997, foi a segunda vez que o plenário teve este assunto nas suas mãos. A anterior foi a 23 de Abril de 1998, quando subiram a plenário dois projectos de lei e uma proposta de lei com esse objecto. Dois destes textos, com origem no Governo PS e no PSD, teriam permitido a introdução complementar de círculos uninominais, fazendo evoluir o sistema para a representação proporcional personalizada de que Portugal necessita. Infelizmente, o debate na generalidade entornou-se numa zaragata em torno da redução dos deputados para cerca de 180 (exigência do PSD) e tudo morreu na altura das votações, por vetos cruzados entre os partidos.
Agora, a 6 de Outubro, o eleitorado deu novas mostras de enorme afastamento, apesar da variedade de escolhas e da seriedade das questões a decidir, fazendo galgar a abstenção nacional de 44,1% em 2015 para inimagináveis 51,4% em 2019! Mais de 5,5 milhões eleitores viraram costas às urnas: não quiseram ir votar em nenhum dos 21 partidos ou coligações candidatos, nem branco, nem nulo.
Mereceria aplauso que os deputados, marcados por este contexto de tão grande alheamento, sentissem maior peso da responsabilidade. Nada disso! Em geral, focaram-se somente nos interesses corporativos, procurando defendê-los, mal. As actas, quando publicadas, mostrarão BE, PCP, CDS e PAN a repetir estribilhos que a experiência doutros países mostra estarem errados: viriam aí a bipolarização e os individualismos. A verdade é outra: querem manter o controlo mais apertado na nomeação dos eleitos. Do PSD e do PS, porém, pode ter-se aberto uma janela: ambos, embora atacando-se mutuamente, deram sinais de um possível processo de reforma, com o PS mais identificado com a petição e o PSD menos explícito. Será que esta semente ainda terá continuidade?
Uma conclusão se comprovou de novo: ou a cidadania agarra vigorosamente neste tema, pondo de pé novos instrumentos e processos, ou dificilmente a reforma sairá do artigo 149º da Constituição, onde foi posta a hibernar. Portugal precisava de, em 20 de Dezembro, se terem aberto as portas ao futuro da democracia em Portugal. Terão de ser os cidadãos a fazê-lo.
Três partidos houve a que não foi dada a palavra: o Chega, a Iniciativa Liberal e o Livre. Nos termos do Regimento, os partidos de um só deputado cada não podem intervir nos debates de petições em plenário. Poderiam ter torneado esta dificuldade: bastaria que tivessem apresentado um projecto de lei ou de resolução sobre a matéria da petição, mesmo com conteúdo minimalista – teriam de ser discutidos com a petição e, nesse caso, até votados. Aí, os deputados desses partidos também poderiam ter marcado a sua opinião. Mas, por inexperiência ou desconhecimento desta possibilidade, ou por o não terem querido, não tiveram voz.
Desde a revisão constitucional de 1997, foi a segunda vez que o plenário teve este assunto nas suas mãos. A anterior foi a 23 de Abril de 1998, quando subiram a plenário dois projectos de lei e uma proposta de lei com esse objecto. Dois destes textos, com origem no Governo PS e no PSD, teriam permitido a introdução complementar de círculos uninominais, fazendo evoluir o sistema para a representação proporcional personalizada de que Portugal necessita. Infelizmente, o debate na generalidade entornou-se numa zaragata em torno da redução dos deputados para cerca de 180 (exigência do PSD) e tudo morreu na altura das votações, por vetos cruzados entre os partidos.
Agora, a 6 de Outubro, o eleitorado deu novas mostras de enorme afastamento, apesar da variedade de escolhas e da seriedade das questões a decidir, fazendo galgar a abstenção nacional de 44,1% em 2015 para inimagináveis 51,4% em 2019! Mais de 5,5 milhões eleitores viraram costas às urnas: não quiseram ir votar em nenhum dos 21 partidos ou coligações candidatos, nem branco, nem nulo.
Mereceria aplauso que os deputados, marcados por este contexto de tão grande alheamento, sentissem maior peso da responsabilidade. Nada disso! Em geral, focaram-se somente nos interesses corporativos, procurando defendê-los, mal. As actas, quando publicadas, mostrarão BE, PCP, CDS e PAN a repetir estribilhos que a experiência doutros países mostra estarem errados: viriam aí a bipolarização e os individualismos. A verdade é outra: querem manter o controlo mais apertado na nomeação dos eleitos. Do PSD e do PS, porém, pode ter-se aberto uma janela: ambos, embora atacando-se mutuamente, deram sinais de um possível processo de reforma, com o PS mais identificado com a petição e o PSD menos explícito. Será que esta semente ainda terá continuidade?
Uma conclusão se comprovou de novo: ou a cidadania agarra vigorosamente neste tema, pondo de pé novos instrumentos e processos, ou dificilmente a reforma sairá do artigo 149º da Constituição, onde foi posta a hibernar. Portugal precisava de, em 20 de Dezembro, se terem aberto as portas ao futuro da democracia em Portugal. Terão de ser os cidadãos a fazê-lo.
José Ribeiro e Castro
Advogado, ex-líder do CDS
Presidente da APDQ - Associação Por uma Democracia de Qualidade
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10 de Janeiro de 2020
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