O papel central das convicções na política
Anteontem, o líder da Iniciativa Liberal, João Cotrim de Figueiredo, cumprimentou o espírito, mas descartou a proposta apresentada pelo líder da JSD, Alexandre Poço, de formação de uma coligação nacional entre PSD, CDS-PP e IL para as eleições autárquicas de 2021. O arrojo da ideia tem o espírito de unidade de acção no espaço democrático à direita do PS. Mas, olhando à História, a proposta terá muitas dificuldades. Mesmo no tempo da Aliança Democrática, com Sá Carneiro e Freitas do Amaral, nunca se conseguiu essa coligação nacional para as autárquicas: houve várias coligações, denominadas UD, em municípios relevantes, mas, na maioria, os partidos concorreram separados. E, mesmo nas eleições legislativas, nunca se conseguiu coligação nas regiões autónomas, pelo que, em rigor, nem AD, nem PàF (com Passos Coelho e Paulo Portas), chegaram a ser coligações “nacionais” propriamente ditas.
Não é isto, porém, que importa comentar. O futuro dirá.
Merece relevo uma das justificações dadas pelo líder da IL: “Não é do interesse de uma solução não-socialista para Portugal entrar já em coligações seja com quem for.” E acrescentou: “O primeiro combate não é o de obter o poder pelo poder, mas ganhar a luta das ideias antes de exercer o poder.”
Está aqui, nesta segunda frase, o combate (determinado e esclarecido) à razão principal da crise (profunda e arrastada) que atravessa o espaço à direita do PS em Portugal: a febre do poder pelo poder e o abandono da luta das ideias como o factor principal. É esta falha que trouxe o CDS tão para o fundo, afecta também o PSD e abriu espaço para o aparecimento da IL – que é importante – e do Chega – que é mais uma interjeição que um partido. O CDS deveu a sua riqueza histórica referencial a uma afirmação doutrinária muito nítida e afirmada: chegou a ter 20% em inquéritos de opinião, nos anos 1980. Isso era essencial à sua identidade e à fixação de implantação e eleitorado. A deriva para uma balbúrdia ideológica ou doutrinária e o esbatimento da sua marca afastou simpatizantes, confundiu o eleitorado e o caleidoscópio, em vez de somar, fracturou e esvaziou.
A luta política, antes de ser política, é cultural. Os partidos ganham, se as ideias que defendem são entendidas, bem explicadas e bem recebidas no mercado. Nenhum partido ganha ou sequer avança, se as suas ideias não ganham terreno, notoriedade, aceitação. E, quando ganha, em ambientes incertos, as vitórias são efémeras, fátuas, passageiras. Porque ganharam apenas pelo poder, não em nome de uma ideia maior e duradoura, o tombo é grande e custa muito recuperar. Durão Barroso/Portas (com Santana Lopes) pagaram isso, comparando 2002 com 2005. E Passos Coelho/Portas também, cotejando 2011 e 2015. O tombo político foi tão grande que, em 2020, PSD e CDS ainda não conseguiram levantar-se, seguindo em quebra nas sondagens.
O combate das ideias é, na verdade, primordial. Não há verdadeira vitória política que não se alicerce nele. É o pensamento que dá consistência à política e capacidade de congregar. É o corpo de ideias que lhe dá grandeza, legitimidade e genuinidade. É nisso – além de no carácter e competência dos políticos – que os eleitores podem confiar, ou não. O baile das ideias desacredita e afasta tanto como a fama de mentirosos.
Ninguém consegue realmente acreditar em quem não mostra acreditar mesmo naquilo que diz. É a convicção que gera a confiança; e é a confiança que mobiliza os eleitores.
A IL é muito bem-vinda à luta das ideias. Não sou liberal, sou personalista. Mas sempre reconheci nas ideias liberais contributos essenciais ao mundo moderno quer na política, quer na economia. Qualquer personalista, que é pós-liberal, sabe isso. E procura dar resposta a questões políticas, sociais e económicas, a que, historicamente, o liberalismo não conseguiu responder. Mas acho muito bem que os liberais, querendo agir, se afirmem pelo seu partido, em vez de agirem como “cucos” dentro dos maiores partidos. O pensamento liberal tem consistência e importância suficientes para ter a sua voz e definir o seu espaço, E, num país que se afunda no socialismo, a simplicidade da intervenção liberal – às vezes desconcertante – faz muita falta.
O combate das ideias é decisivo. E o necessário é que os outros respondam ao mesmo chamamento e mostrem que lutam por ideias – ideias boas, ideias justas, ideias rectas. Os que buscarem o poder pelo poder merecerão perder. Só merecerá ganhar quem lutar por convicções. Ali, servem-se a si. Aqui, servem a todos, ao Bem Comum.
José Ribeiro e Castro
Advogado, ex-líder do CDS
Presidente da APDQ - Associação Por uma Democracia de Qualidade
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25.Setembro.2020
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