Assunção Cristas, Lisboa e o CDS


Assunção Cristas declarou que não será candidata nas autárquicas. Tenho pena, embora possa compreender e não haja senão aceitar.

Quem investe em títulos, com valores variáveis na bolsa, sabe haver momentos em que é crucial capitalizar as mais-valias. Se não, os aparentes lucros esvaem-se nas contínuas variações do mercado. Os ganhos nos placards voam como vento.

Esta era a altura para fazer a capitalização dos resultados autárquicos em Lisboa-2017, por duas razões: primeiro, porque é a eleição seguinte que pode consolidar o novo degrau, ajudando a ir adiante; segundo, porque as eleições nacionais, entretanto, não correram bem e a líder do CDS saiu por causa destas.

Assunção Cristas conseguiu resultados extraordinários em Lisboa: 20,6%! O CDS deve-o à sua Presidente da altura. Cristas entregou-se a este objectivo, após a eleição para líder no princípio de 2016. Além de Paulo Portas, nenhum líder quisera concorrer à Câmara. Portas teve 7,6% em 2001, com o CDS na cotação nacional de 8,4% (legislativas 1999). Não correu bem: na noite eleitoral em que Santana Lopes conquistou Lisboa com 42%, Paulo Portas anunciou, internamente, demitir-se. Só a demissão de Guterres na mesma noite, rejeitando o “pântano”, travou a saída.

Cristas aplicou-se em Lisboa, com ambição e propósito. É claro que podem dizer que teve muita sorte – e teve. Mas a sorte, é sabido, custa normalmente muito trabalho. Assim foi. Quando chegou a recta final, a campanha mostrou que, além do Presidente Fernando Medina, havia outra pessoa que sabia da cidade, seus problemas, desafios e respostas: Assunção Cristas. Aí estava o fruto de centenas de horas de trabalho, estudo, discussão, caminhadas, reflexão e diálogo.

Tem cumprido o mandato municipal, diversamente de outros que não o fizeram. Por isso, querendo CDS e PSD concorrer coligados em Lisboa, Cristas, se o quisesse (e repusesse o fulgor anímico de 2017), era a melhor para encabeçar a coligação. Para ela, seria o justo prémio ao trabalho. Para PSD e CDS, a melhor hipótese para ambicionarem ganhar. Lembro que, em 2017, houve dirigentes, do lado PSD, que também o pensaram; mas as coisas haviam começado mal, nomeadamente pelo lado do CDS.

Sem Assunção Cristas a cabeça-de-lista, o CDS, salvo alguma carta fora do baralho, não tem hipótese de aspirar a liderar a coligação, como as regras formais ditariam. As coisas são como são. 2017 foi um resultado isolado. Nas legislativas de 2019, que ditaram a saída da líder, Lisboa deu 5,9% ao CDS, quase 1/5 do PSD. 

A experiência das autárquicas de 2017 trouxe outras lições. A tal “sorte” que Assunção Cristas teve decorreu das “guerras” no PSD, que incendiaram Lisboa. Muito eleitorado mudou-se, então – com armas, mas sem bagagens. Com um PSD normal, o CDS iria aos 10%, muito bom resultado, aliás. Com o brinde das bulhas no vizinho, só parou nos 20%. 

Esta questão põe-se, agora, ao CDS. Se se guerrear como o PSD de 2017, colherá igual. Cabe lembrar que, dez anos antes, nas intercalares de 2007, o CDS, no rescaldo de outra “guerra”, não passou de 3,7% em Lisboa. Em 2005, elegera Maria José Nogueira Pinto com 5,9%, quando tinha a cotação nacional de 7,3% (legislativas 2005). Nos restos das refregas de 2007, não conseguiu eleger Telmo Correia. Única vez desde 1976, ficou sem um só vereador.

Não é boa ideia querer repetir a dose.


José Ribeiro e Castro
Advogado e ex-líder do CDS

DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 17.Fevereiro.2021

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