Notas à boca das urnas
As eleições autárquicas são as eleições mais importantes da democracia. Exprimem a auto-administração pelas populações e o grau de maior proximidade da escolha política. Independentemente das diferenças de ideias políticas, por vezes muito acentuadas, são as que mais constroem um ambiente não crispado, nem confrontacional, indispensável ao convívio político e à paz cívica.
Por isso, a primeira nota é sobre a abstenção: subiu mais 1,3% sobre um valor já alto. Agora, 46,3% não foram votar, apesar de repetidos apelos de Presidente da República e vários líderes. É de mais!
Ninguém quis notar um facto inquietante: nas legislativas de 2019, atingimos um nível de abstenção obsceno, superando, pela primeira vez nestas eleições, os 50%. Pois bem, a abstenção destas autárquicas foi pior. Temos de comparar votações em território nacional, pois, nas autárquicas, não há emigração. Assim, a abstenção de 46,3% compara com 45,5% em 2019 para o Parlamento. Conseguiu piorar.
Há várias causas, sabemo-lo. Uma delas, sabemos também, é o descrédito que se deixou crescer no sistema de representação e nos partidos. A partir das eleições partidárias por excelência (as parlamentares), o descrédito foi contaminando todas as eleições: não há uma que escape à degradação. Grave responsabilidade cabe aos que insistem em impedir a reforma do sistema eleitoral que foi aberta na Constituição há 24 anos, tema em que tenho trabalhado. Essa reforma, por um sistema misto de círculos uninominais e plurinominais, permitiria reconciliar o sistema com a cidadania, melhorar o funcionamento dos partidos e elevar o seu crédito. Só isso restaurará a alegria e a confiança de ir votar. Devolverá à democracia a autenticidade de que sempre precisa.
A segunda nota vai para o conjunto de Câmaras Municipais em cujo governo o CDS passou a participar, tema que vi ser muito apagado. O CDS manteve as seis Câmaras que detinha sozinho (Albergaria-a-Velha, Oliveira do Bairro, Ponte de Lima, Santana, Vale de Cambra, Velas). Manteve as 15 onde estava em coligação com o PSD e, por vezes, outros (Alijó, Amarante, Amares, Armamar, Cascais, Castro Daire, Estarreja, Maia, Ourém, Penafiel, Rio Maior, Tabuaço, Torre de Moncorvo, Trofa, Vila Nova de Famalicão) e o envolvimento no movimento de Rui Moreira, que lidera o Porto. E, agora, conseguiu acrescentar mais 19 deste grupo, o que é notável e extraordinário: Alter do Chão, Barcelos, Coimbra, Funchal, Horta, Lamego, Lisboa, Mêda, Miranda do Douro, Mourão, Nelas, Santa Cruz da Graciosa, Vila da Praia da Vitória, Vila Flor, Oliveira de Frades, Portalegre, Redondo, São Vicente, Vila Viçosa – esta última tirada directamente à CDU! Por outras palavras, o CDS estava no governo de 22 municípios; passou a estar em 41. É uma grande responsabilidade.
Dir-se-á: ah! Mas isso são coligações, não foi o CDS que ganhou. Certo! São coligações, não foi o PSD que ganhou. Venceram todos os que as integram. Saúdo, aliás, Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos pela sagacidade de as terem feito e o sentido estratégico que revelaram. Esse era o caminho certo para o centro-direita encetar a viragem.
Os resultados estão à vista. Se não fossem as coligações e a disponibilidade inteligente e patriótica do CDS, o PSD não obteria, como era crucial, os ganhos líquidos que pôde apresentar. É de lamentar que as oposições internas profissionais, que tanto fizeram para comprometer este ano eleitoral, continuem a demonstrar não entender os caminhos da mudança.
A última nota vai para Lisboa. Carlos Moedas, com a coligação, arrancou uma vitória que não era esperada. Não foi uma vitória arrancada a ferros; foi arrancada com trabalho, inteligência e visão. Terá uma governabilidade difícil e muito apertada. Mas, além da sua experiência e capacidade, contará com o apoio de todos os lisboetas que querem o bem da cidade. Não estarão para aturar jogos e bloqueios contra o bem comum. Vai ser interessante de seguir; melhor ainda, ver crescer o apoio à ação do Município.
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