Dia de Portugal


Hoje, é o nosso dia: o Dia de Portugal por natureza das coisas. É o dia – 1.º de Dezembro – em que celebramos a independência, o facto de sermos livres e soberanos, senhores de nós, de podermos escolher o nosso destino, eleger os nossos amigos, parceiros e aliados, termos voz própria nossa no contexto internacional. É o dia sem o qual não seríamos. Olhando ao mundo (hoje) e à história (desde sempre), vemos como é um precioso privilégio.

Há também o Dia de Portugal no 10 de Junho, com um outro olhar sobre nós: o olhar da língua e das comunidades, o olhar de Camões, o Portugal da Portugalidade. O dia 1 de Dezembro é o dia do Portugal que, tendo nascido, mais tarde se restaurou, o dia sem o qual nem o 10 de Junho existiria. É o dia da terra, o dia das raízes e do tronco, o dia em que, perante todos, nos afirmamos livres, próprios e de pé. 

Faz, hoje, 10 anos que, noutro 1.º de Dezembro, ouvi, num telejornal na RTP, o meu antecessor na Sociedade Histórica protestar contra o anúncio da eliminação do feriado. A jornalista dizia que era a última vez que se celebrava o 1.º de Dezembro. José Alarcão Troni respondeu que isso não podia ser, porque o 1.º de Dezembro era “a data sine qua non”. É isto mesmo: a data sem a qual, nada. O feriado foi, por isso, defendido e acabaria restaurado. 

É curiosa a história e a valia desta data, estimada, seguida e lembrada espontaneamente em inúmeras localidades do país, de modos populares muito simples, às vezes comoventes na sua simplicidade, mesmo longe dos grandes meios de comunicação social. Curioso como celebramos a independência nacional, não com referência às grandes datas da fundação (com marcos em 1128, 1139, 1143 e 1179), mas convocando a grande data de 1640. Faz sentido, porque, no único período da nossa História em que fomos perdendo a independência (1580-1640), esse foi o dia em que a resgatámos, restaurando a separação da nossa Coroa. Faz sentido, porque sentimos mais os bens essenciais quando os perdemos. A guerra de 1640 a 1668, na Europa e em possessões ultramarinas, foi o duríssimo sinal do seu alto preço.

Sendo uma monarquia, o 1.º de Dezembro é uma data como que em modo republicano, porque tivemos que romper a dinastia para restaurar com D. João IV, Duque de Bragança, a liberdade. Um facto semelhante à crise do século XIV (1383-85), quando também tivemos que romper outra dinastia para, com D. João I, Mestre de Aviz, defender a liberdade de Portugal. 

Instituído o feriado em 1910, com o advento da República e definidos os feriados ao modo dos Estados modernos, foi especialmente feliz o nome por que, então, o 1.º de Dezembro foi festejado: “Dia da Autonomia da Pátria Portuguesa e da Bandeira”, as duas denominações escolhidas por decretos dos Governos provisórios de Outubro e Novembro de 1910.

Há muitos debates, talvez demasiada conversa, em torno de sabermos se temos muitos ou poucos recursos – e quais são –, se somos pobres ou somos ricos, se temos futuro e qual. Não tenho dúvida nenhuma: temos muitos e importantes recursos, só temos que definir o que fazer com eles. Construí uma teoria a esse respeito. 

Mas o maior recurso de Portugal é Portugal ele mesmo, é o facto de sermos. É verdadeiramente formidável: os portugueses que somos, o território que temos (terra, mar e ar), a extraordinária posição geográfica, a História e a Língua por todo o mundo. Fantástico! Cada vez gosto mais de Portugal. Não me canso de gostar de Portugal.

E como não temos futuro? Como pode pensar isso quem é de um país prestes a comemorar 900 anos? Quem o diria possível quando começou 1128? Quem o acharia provável antes de Aljubarrota ou depois de Alcácer Quibir? Quantos países há com nove séculos? Quantos há, como a Nau Catrineta, que tenham muito para contar? 

De longe vimos, para longe vamos. Temos imenso onde assentar brio e amor-próprio, ânimo e propósito, sonho e ambição. Que privilégio sermos Portugal!


José Ribeiro e Castro
Ex-líder do CDS, advogado

DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 1.Dezembro.2021


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