Feliz e Santo Natal – a mensagem de Helena Dalli


Em 26 de Agosto de 2020, o comissário europeu do Comércio, Phil Hogan, irlandês, apresentou a demissão depois de “ter violado regras de contenção contra a covid-19, ao ter participado num jantar na Irlanda com mais de 80 pessoas.” Hoje, 22 de Dezembro de 2021, não é possível perceber como ainda está no cargo a comissária Helena Dalli, maltesa, depois de ter sido forçada a recolher o manual de linguagem que se preparava para impor: além de várias passagens ridículas, atacava especialmente as referências cristãs, apontando sobretudo contra o Natal, palavra proibida.

A mera ideia de um manual destes, construído com arrogância de super-Estado, é, em si mesma, uma ideia totalitária, a que só ignorantes ou distraídos não reconhecem instintivamente o abuso, a violência e o perigo. Se a Comissão Europeia controlar e comandar a linguagem, dominará o pensamento. Que tirano o não quer?

Tem a Comissão poderes para isto? Não tem. O que tem é, ao contrário, poderes para combater isto, pois os Tratados obrigam a defender e respeitar a liberdade, a democracia, os direitos humanos.

Por que não desautorizou já a Comissão a maltesa Dalli? Por que não condenou já a Presidente Ursula von der Leyen o intolerável manual, garantindo que até ao fim do mandato não se repetirá a graça? Por que não pede a Comissão que o Tribunal de Justiça remova Dalli de modo compulsivo? Porque, infelizmente, quanto ao sopro do totalitarismo, a Comissão já aceita conviver não só com o ovo da serpente, mas também com a serpente que põe os ovos.

A primeira vez que, como deputado, entrei no plenário do Parlamento Europeu, em Estrasburgo, foi em 13 de Dezembro de 1999. Lembro-me como se fosse hoje; fui confirmar a data.

A sessão das segundas-feiras abria com temas levantados livremente por deputados. Entrei na altura em que um deputado dinamarquês, Mogens Camre, se queixava à Mesa por os cartões de Natal distribuídos para uso dos parlamentares omitirem qualquer representação de referências cristãs do Natal em todos os modelos adoptados. A observação acendeu animado debate sobre se o Natal era, ou não, “uma tradição europeia”. Trocaram-se argumentos e emoções. Falaram muitos deputados à esquerda, à direita poucos. A conclusão do debate foi que “não, o Natal não é uma tradição europeia”. Assim concluiu a Mesa. Nesse dia, aprendi onde acabava de entrar.

Poucos anos depois, na Convenção Europeia que preparou a Constituição Europeia, o Preâmbulo causou forte polémica. Redigido em estilo heroico, como de quem funda um mundo novo, o Preâmbulo ocultava as raízes cristãs da Europa: começando na Antiguidade Clássica, na Grécia e em Roma, voava 14 séculos por cima de nada, para reaparecer no século das Luzes e na modernidade. Nem as catedrais viu, quanto mais as pessoas que pensam e rezam, que crêem e fazem. A polémica subiu de tom em 2003/04, com divisão entre Estados-membros e dentro destes. A cidadania mexeu-se. Juntando colegas europeus, lançámos um abaixo-assinado de 1,5 milhão de subscritores, que, estando na Presidência italiana da UE, entregámos, em Roma, no Palazzo Chigi, a exigir a correcção da escandalosa omissão. O saldo final foi match nulo: o Preâmbulo de estilo heroico foi abandonado; e retomado o modelo clássico de estilo sóbrio, mas suficiente. Mas ficou a ameaça do grande apagão.

Este caso da comissária Dalli, que só por anedota é a “da Igualdade”, e do seu guião totalitário é o escândalo mais recente. Por que não a condena o Parlamento Europeu? Por que não a enxovalha, da mesma forma que aprecia fazer a Órban ou a Morawiecki? Porque o totalitarismo já circula nas bancadas e consegue condicioná-lo.

Olhemos os dois casos, dos comissários Hogan e Dalli. É mais grave estar num jantar com 80 pessoas do que discriminar e atingir todos os cristãos?

A senhora Dalli, pelos vistos, ignora o que é liberdade de expressão. E as instituições europeias? Sabem? Apreciam vigiar Polónia e Hungria, onde há debate público, manifestações, eleições democráticas. Mas não sabem vigiar a Comissão Europeia, onde ameaças do calibre da comissária maltesa apenas são conhecidas por uma fuga para a imprensa. Como é possível?

Desejo a todos Feliz e Santo Natal, como gostamos de fazer. Não há nada mais inclusivo do que o Natal. Continuaremos a fazê-lo enquanto aquelas ameaças não triunfarem, impondo a proibição. Mas não podemos só esperar. O dever é levantarmo-nos e impedir que alguém, quem quer que seja, onde quer que seja, sonhe só em proibir. Essa é tarefa para o Ano Novo. Que seja bom também.


José Ribeiro e Castro
Ex-líder do CDS, advogado

DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 22.Dezembro.2021

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