8 de Abril, um dia para a História
Este 8 de Abril de 2022 ficará para a História, tamanho é o significado da presença da Presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, em Kyiv, para reunir com o Presidente ucraniano, Volodomyr Zelensky. É um feito histórico de primeira grandeza, por que só podemos dizer duas palavras: Bravo! Obrigado!
Este extraordinário passo de construção europeia havia sido aberto, é justo lembrá-lo, a 1 de Abril, pela visita pioneira a Kyiv da Presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, como que a desafiar, em representação dos cidadãos europeus, passos mais ousados da União Europeia. Neste brilhante 8 de Abril, ficámos a saber que não é só uma, mas são duas as mulheres que, num dos momentos mais difíceis e perigosos da vida das gerações posteriores a 1945, lideram a diplomacia política europeia com claridade e arrojo, ousadia e coragem, de mãos desarmadas, gestos de paz e voz carregada de futuro. Lideram pelo exemplo: mostram como se faz a outros líderes e responsáveis de governos e organizações internacionais.
Se, por uma decisão de loucura, as autoridades da Rússia puseram a História a escrever-se em Kyiv e nas cidades-mártir da Ucrânia, é lá que é preciso ir, é lá que é preciso estar.
Ursula Von der Leyen, acompanhada pelo Vice-presidente e Alto Representante para a Acção Externa, Josep Borrel, esteve bem em tudo. Esteve bem ao anunciar a visita: “Quero enviar uma mensagem de apoio inabalável ao povo ucraniano e à sua corajosa luta pelos nossos valores comuns.” Esteve bem em Bucha, onde viu a extrema barbaridade sobre os civis: “É impensável o que aconteceu aqui. Vimos a face cruel do exército de Putin.” E esteve muito bem, na reunião final com Zelensky, onde lhe entregou o envelope com a documentação para iniciar o processo de adesão: “A Ucrânia pertence à família europeia. Hoje estamos aqui para lhe dar a primeira resposta positiva. Neste envelope, há um importante passo para a adesão à União Europeia.” No discurso, prometeu fundos para reconstruir a Ucrânia e acentuou: “Aqui começa o caminho em direção à UE”, garantindo que a análise da candidatura “não vai ser, como sempre, uma questão de anos, mas antes de semanas.”
Nunca um Presidente da Comissão estivera em situação de tamanho risco pessoal para cumprir a sua função. (Lembremos que houve guerra nesse dia, como em todos desde o demencial 24 de Fevereiro, e que, na manhã desse mesmo 8 de Abril, as forças de Putin dispararam aquele míssil cobarde sobre a estação de comboio de Kramatorsk, matando 100 civis e ferindo muitos mais.) Nunca houvera outro numa frente de guerra, a manifestar presença e solidariedade. Nunca outro iniciara de forma tão célere um processo dirigido a abrir uma candidatura à adesão. Nunca outro fizera investimento tão audaz e tão total na paz. Nunca outro enfrentou a enorme complexidade de uma conjuntura dura e perigosa com essa escorreita simplicidade da razão.
Ursula Von der Leyen fez todas essas estreias. E, ao agir assim, fez mais. Encheu de prestígio a Comissão Europeia. Reavivou a razão de ser da construção europeia. Reforçou a segurança da fronteira leste da União – e doutros – não só por lhe acrescentar a quase presença já da Ucrânia, mas por assim proteger também as fronteiras de Estónia, Letónia, Lituânia, Polónia, Eslováquia, Hungria, Roménia e Bulgária – e também da Moldávia.
Foi também a 8 de Abril que, em entrevista à Sky, Dmitry Peskov, o porta-voz do Kremlim, se exprimiu assim: “Temos perdas significativas de tropas e é uma grande tragédia para nós”, falando em “milhares de mortos”. Em qualquer situação de guerra, esta é uma admissão rara. E, num regime autocrático, é inédito. Quando assim é, costuma prenunciar o fim.
Oxalá se confirme, a guerra acabe cedo e Putin seja destituído. A paz com Putin será sempre impossível. Mas nós precisamos de paz e amizade com a Rússia, do mesmo modo que, acredito, a Rússia e os russos também precisam de paz e amizade com o resto da Europa. Putin mais do que uma guerra, tem feito tiro ao alvo sobre os ucranianos, como as cidades-mártir evidenciam: Bucha, Borodyanka, Hostomel, Kharkiv, Mykolaiv, Chernihiv, Mariupol e tantas outras. Não há uma cidade russa com um só arranhão, mas a Ucrânia está cravejada de chagas e cicatrizes. Putin é a marca da mentira e da brutalidade. Tem de sair de cena para o futuro poder começar.
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