1. Há cinco semanas, num primeiro artigo sobre o tema dos abusos sexuais na Igreja,
“Tolerância zero, solicitude infinita”, citei trechos dos Evangelhos. No princípio, citei o de São Mateus: «Mas qualquer que escandalizar um destes pequeninos, que crêem em mim, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma mó de azenha, e se submergisse na profundeza do mar. Ai do mundo, por causa dos escândalos; porque é mister que venham escândalos, mas ai daquele homem por quem o escândalo vem!» (Mt 18, 6-7) No fim, lembrei o de São Lucas: «É impossível que não venham escândalos, mas ai daquele que os causa. Melhor seria que lhe atassem ao pescoço uma pedra de moinho e o lançassem ao mar, do que escandalizar um só destes pequeninos. Tende cuidado convosco!» Lc, 17, 1-3)
Os dois relatos têm uma pequena diferença relevante: em Lucas surge o remate “Tende cuidado convosco!” O que quis Jesus dizer com estas palavras? Estaria Jesus a fazer um apelo? Um alerta? Um aviso? Uma recomendação? Uma advertência? Possivelmente, todos ao mesmo tempo, consoante as circunstâncias e os respectivos destinatários.
Essas palavras dirigem-se evidentemente, em primeiro lugar, à Igreja, a todos os cristãos, pois Jesus estava a dirigir-se aos seus discípulos. “Tende cuidado convosco!” – é a atitude que, na Igreja, todos têm de ter relativamente aos escândalos, prevenindo-os e respondendo prontamente quando acontecem. O pensamento, o olhar, a acção tem de estar principalmente nas vítimas, a que importa levar solicitude. E sancionar os autores, que é também reparação e prevenção. Este quadro não afasta a possibilidade de injustiça sobre sacerdote, religioso ou outro servidor acusado sem fundamento. Para estes, Jesus deixou outras palavras: “Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, pois deles é o Reino dos céus. Bem-aventurados serão vocês quando, por minha causa, os insultarem, os perseguirem e levantarem todo tipo de calúnia contra vocês.” (Mt 5, 10-12)
Mas, além da Igreja, as palavras de Cristo sobre os escândalos (incluindo “Tende cuidado convosco!”) dirigem-se ainda a qualquer outro no mundo, quer aos que causem os escândalos, quer aos que lidem com eles. “Ai do mundo, por causa dos escândalos.”
2. Já praticamente tudo foi dito e escrito sobre a conferência de imprensa da Conferência Episcopal Portuguesa, no dia 3 de Março. Correu mal, a mensagem não passou e a que passou foi confusa. Houve que a esclarecer vezes sucessivas nos dias seguintes, quer pelo Presidente da CEP, quer por outros bispos. Não vou acrescentar nada sobre isto. Apenas quero comentar a afirmação que alguns fizeram, incluindo membros da Comissão Independente, de que os bispos, nesse dia, não tiveram uma palavra para as vítimas. Não é verdade.
A conferência de imprensa destinou-se a comunicar a posição da Assembleia Plenária Extraordinária dos bispos portugueses, o que fez por um
Comunicado escrito, apresentado, lido e distribuído nessa reunião com a comunicação social. Esse texto de 3 de Março da Igreja portuguesa está
disponível para quem o quiser ler na íntegra. É surpreendente como esse texto desapareceu em combate. Não o vi publicado em sítio nenhum, salvo no portal da CEP. Mas todos o tiveram. Estou certo de que a Comissão Independente também. É, aliás, um documento que se mantém público e aquele que traduz a posição colegial oficial dos bispos portugueses. Não é um papelinho, é um texto de referência muito importante.
Penso que esse foi o erro basilar da comunicação episcopal: abandonar à indiferença e ao esquecimento o Comunicado lido e distribuído. Os bispos, nesse dia, não deviam ter saído desse texto, chamando continuamente a atenção para esse documento, com toda a delicadeza e clareza. A cada pergunta, regressavam ao texto cujo teor estavam a comunicar. A Igreja, é sabido, comunica mais e melhor por textos escritos do que por palavras orais. Sobretudo em momentos difíceis, fundamentais, definidores, como aquele: a primeira posição da Igreja portuguesa, depois da divulgação do relatório da Comissão Independente.
Voltando ao Comunicado que foi omitido, está lá tudo.
Por exemplo, sobre as vítimas: “Moveu-nos, desde o início, o desejo de ir ao encontro daqueles que foram vítimas desta situação dramática. (…) é também ao encontro das vítimas que queremos ir. É a elas que queremos continuar a dar voz para que o seu sofrimento não fique calado.”; “profundo agradecimento a todas as vítimas que deram o seu testemunho ao longo do último ano”; “uma palavra de coragem a todas as vítimas que ainda guardam a dor no íntimo do seu coração para que possam “dar voz ao silêncio”. Estamos disponíveis para acolher a vossa escuta”; “pedimos perdão a todas as vítimas de abusos sexuais no seio da Igreja Católica em Portugal.”; “firme propósito de tudo fazer para que os abusos não se voltem a repetir”; “As feridas infligidas às vítimas são irreparáveis.”; “se o desejarem, terão o nosso acolhimento e disponibilizaremos o devido acompanhamento espiritual, psicológico e psiquiátrico”; “dioceses assumem o firme compromisso de dar todas as ajudas necessárias para que tal aconteça.”
Não é verdade, portanto, que os bispos portugueses se esqueceram das vítimas na primeira reacção colectiva ao relatório da Comissão Independente. Dizer isso é mentira. O pensamento a respeito das vítimas e a orientação de solidariedade e solicitude para com estas é, aliás, como deveria ser, a parte que ocupa mais espaço no comunicado da CEP. Que isso tenha sido soterrado pela dinâmica da conferência de imprensa, isso é outra história. Os bispos deveriam ter-se concentrado no texto. Mas também todos aqueles que, de boa fé, querem conhecer a posição efectiva do episcopado
tiveram-na e mantêm-na à disposição.
O Comunicado dessa 105.ª Assembleia Plenária extraordinária da CEP enuncia, ainda, além de quanto às vítimas, a posição sobre outros temas: a atitude perante os abusadores, o papel das Comissões Diocesanas, o trabalho da Comissão Independente, este momento denso para toda a comunidade eclesial. Basta ler o que escreveram todos os bispos, em conjunto: “tolerância zero para com todos os abusadores e para com aqueles que, de alguma forma, ocultaram os abusos praticados dentro da Igreja Católica”; “reconhecemos a necessidade de estruturas concretas para o seu acompanhamento espiritual, pastoral e terapêutico.”; “A lista com o nome dos alegados abusadores, hoje entregue, (…) terá o devido seguimento por parte dos Bispos Diocesanos e Superiores Maiores segundo as normas canónicas e civis em vigor.”; “Reconhecemos o trabalho imprescindível das Comissões Diocesanas e da Equipa de Coordenação Nacional e propomos que sejam constituídas apenas por leigos competentes nas mais diversas áreas de atuação, podendo ter um assistente eclesiástico.”; “Agradecemos o trabalho da Comissão Independente pedido pela Conferência Episcopal Portuguesa, que tinha desde o início objetivos e prazos definidos. As conclusões e sugestões apresentadas estão a ser tidas em conta e faremos tudo o que for necessário, com firmeza, clareza e determinação, para uma cultura de cuidado e proteção dos menores e adultos vulneráveis.”; “A todos os fiéis e sacerdotes que servem a Igreja e que neste momento sofrem com os impactos deste estudo, manifestamos a nossa proximidade e encorajamento, na esperança de que estas circunstâncias nos estimulem à renovação da própria Igreja.”
Estas eram as posições a transmitir. E, na verdade, não faltava nada. O que fez descarrilar a conferência de imprensa foi a lista de abusadores, desconhecida e entregue nesse mesmo dia, que passou a constituir foco de atenção alternativo ao Comunicado dos bispos e mais picante do que este. A CEP devia ter-se concentrado unicamente no comunicado, que era a sua agenda – não a lista. Entrar no desvio da comunicação favoreceu que a lista, desconhecida, funcionasse objectivamente como uma casca de banana, à queima-roupa. Correu mal. Abafou o texto colectivo da CEP. E gerou muito ruído nos dias a seguir, ruído devido, na maior parte, ao embate da lista com a realidade.
3. A lista dos abusadores, como ficou conhecida, foi um documento longamente trabalhado, pensado e planeado pela Comissão Independente. Corresponderia a uma lista de 100 sacerdotes no activo denunciados como autores de abusos sexuais. Sabemos, hoje, que não é exactamente assim. Nem todos eram sacerdotes, havendo alguns leigos – informação corrigida ainda antes da entrega da lista. Mas o número era 100 ou mais de 100, estando todos no activo; e a pressão mediática feita era, por conseguinte, que seriam 100 a suspender cautelarmente (ou, na fórmula correcta, provisoriamente “afastados do exercício público do ministério”).
Basta rever alguns títulos:
·
OBSERVADOR – 1 mar. 2023, 11:55 – “Abusos na Igreja. Comissão entrega lista de alegados abusadores à Igreja e ao MP na sexta-feira. Depois reúne-se com ministras”
No público, só fomos conhecendo o teor efectivo da lista, a pouco e pouco, à medida que cada diocese foi dando conta da parte que lhe correspondia. A estrutura da Igreja é diocesana – e, acima de cada bispo, o Papa. No final, a lista reportava 98 possíveis abusadores (a diferença para os anunciados 100 ou mais de 100 não tem outro relevo, senão falta de rigor das fontes); e, o que é mais relevante, eram muitos os que já não estavam no activo, sendo que 36 tinham morrido, alguns há muitos anos.
Elementos da Comissão Independente referiram que o facto de a lista incluir mortos (o que não se sabia) deveu-se ao propósito de, apesar de o alegado abusador ter morrido, não podendo ser investigado, ter de atender-se sempre à respectiva vítima e aos abusos de que foi objecto, para lhe assegurar apoio e poder assumir-se responsabilidade. Mas a explicação tem de ser outra. Defendo o princípio da prioridade à solicitude para com a vítima, mas, para isso, não era preciso divulgar que a lista continha unicamente responsáveis no activo. Se, como foi dito depois, fora decidido alargar a lista a quem não estava no activo, a decisão não devia ter ficado no segredo. E, se o facto de não ser só de sacerdotes no ativo foi transmitido à Conferência Episcopal em 3 de Março, é pena que isso mesmo não tenha sido revelado publicamente, corrigindo todas as notícias anteriores e desse mesmo dia.
Laborinho Lúcio tem parcialmente razão, quando,
em entrevista, lamentou: "Isto foi um facto que foi criado. Deixámos de discutir o relatório." É verdade, mas esse ónus não pode ser deixado sobre os ombros dos bispos. O fardo do ruído caiu sobre os bispos, que não têm nisso responsabilidade. A lista não foi da sua criação. E não foram os bispos que escolheram a oportunidade da sua entrega/recepção, nem podiam saber do seu conteúdo para informar a comunicação social como foi feito.
Os bispos só podiam fazer o que fizeram: dar seguimento à lista que cabia a cada um, conforme as diferentes situações, as responsabilidades a apurar e a demais acção que motivasse. É nisso que temos estado, a um ritmo melhor (para já, muito melhor) do que a justiça pública nos tem habituado. E tem se ser assim. A Igreja não resistiria ao labirinto, à curva e contracurva, aos expedientes, à dilação em que a justiça se enreda, às vezes nos casos mais graves e escandalosos.
A atitude dos bispos também não tem sido a de discutir o relatório. O relatório não é tanto para discutir, mas para tê-lo em conta, seja para apurar responsabilidades e punir os que tenham sido os abusadores, seja para ir ao encontro das vítimas e reparar o mal. É isto que importa quer pela gravidade dos factos em si, quer como alavanca para melhorar o desempenho geral da Igreja.
4. As dioceses têm trabalhado as listas da Comissão Independente, recebidas. Com excepção das dioceses de Santarém e Castrense, a que não foi reportado qualquer caso, resumi os dados divulgados pelas dioceses no seguinte quadro, três semanas após a entrega da lista global:
SITUAÇÃO
|
ALEGADOS ABUSADORES
|
Falecidos
|
36
|
Outros já
retirados
|
10
|
Desconhecidos
ou exteriores à diocese
|
13
|
Ilibados
|
4
|
Já punidos
|
4
|
Medidas
cautelares e investigação
|
22
|
Aguarda mais
informações
|
9
|
|
98
|
Num total de 98 listados, 46 já estavam totalmente fora do activo: 36 falecidos e mais 10 retirados – dois doentes e retirados (Lisboa), um que deixou o sacerdócio (Lisboa) e sete sem ofício eclesiástico (três no Funchal, três em Lisboa e um em Viana do Castelo). Há ainda 13 que são desconhecidos ou exteriores à diocese onde foram listados: a maioria eram indicados como sacerdotes, mas desconhecidos (sete), havendo também um outro agente pastoral (Braga) e dois leigos (Leiria-Fátima e Lisboa), de que um já terá morrido. Estes três conjuntos perfazem 59 do total de 98 (60,2%).
Passando àqueles sujeitos a investigação, oito já tinham tido processos concluídos: quatro foram ilibados (três casos arquivados pelo Ministério Público e uma absolvição) e quatro concluíram pela aplicação de sanções. A seguir, há 22 que se pode considerar que foram objecto de medidas cautelares, no quadro de averiguações: três já o tinham sido, antes da lista (um em Lisboa, dois em Setúbal); 14 foram objecto de afastamento cautelar pela respectiva diocese, após a recepção da lista (Angra, Braga, Évora, Guarda, Leiria-Fátima, Lisboa, Porto e Vila Real); e cinco (todos os casos de Viseu) estão sob inquéritos civis e canónicos, presumindo eu que incluindo as respectivas medidas cautelares. Enfim, há nove casos que aguardam ainda informação: num, verificou-se que não houve abuso, mas manteve-se aberta a investigação (Coimbra); em seis, nada constava, mas manteve-se o processo aberto (quatro do Porto e dois de Setúbal); enfim, a Guarda pediu mais informação em dois casos. É de presumir que estes quatro do Porto estejam incluídos na documentação que a
diocese anunciou recentemente ter submetido já a Roma, para orientação, podendo haver novidades para breve.
Não se pode dizer que as dioceses não estejam a fazer o seu trabalho. Bem vistas as coisas, as medidas cautelares podem ter coberto 100% dos casos onde pode haver averiguação – até esta altura, 22, salvo erro ou omissão. Nos oito com processos concluídos, o problema não se punha, salvo surgindo dados novos; e nos nove em que há falta de dados determinantes, é de presumir que serão logo adoptadas medidas cautelares, se surgirem informações nesse sentido (como sucedeu em Lisboa e no Porto). O mesmo sucederá certamente com aqueles dos 13 desconhecidos ou de outra diocese, assim que, havendo fundamento para proceder, se saiba quem são ou onde pertencem.
5. Entretanto, na semana passada, tornou-se notícia a pendência de alegações contra um sacerdote. O facto constitui enorme surpresa e o visado tornou pública a sua compreensível reacção. Também eu, do que conheço, sinto o facto como correspondendo a uma grande injustiça, que só pode dever-se – acredito – a um gigantesco equívoco ou tremenda perversidade, própria de quem ande nestas coisas com má-fé e se aproveite do anonimato como autoestrada da infâmia. Era um incidente inteiramente dispensável. A imputação é com certeza infundada. Confio que “a verdade é como o azeite: vem sempre ao de cima.” E qualquer injustiça – esperemos sempre que passageira – é também consequência indirecta da desordem causada pelos que, na Igreja, cometeram abusos sobre menores e derramaram a lama sobre outros.
No estado a que toda esta questão chegou, creio que a diocese agiu bem, uma vez que cumpre fazer a prova do azeite, com rigor e sem perturbações do exercício sacerdotal. A metodologia de afastamento cautelar perante uma denúncia aceite para investigação está certa e é incontornável para restabelecer a confiança no processo de averiguação canónica. Creio até que é melhor para o sacerdote injustamente visado. Claro que é melhor não ser apontado sem verdade, mas, tendo-o sido, é melhor assim, até tudo estar claro. A reposição da confiança nos procedimentos da Igreja é um dos elementos fundamentais para o decidido virar de página neste dossier tão triste e doloroso.
O sacerdote visado manifestou também essa aceitação, na comunicação que fez. Depois de dar voz à sua surpresa e indignação, escreveu: «coloquei-me, ainda assim, à disposição do [meu bispo], para que tomasse as medidas cautelares que entendesse adequadas, no âmbito da investigação prévia que agora se iniciará e dos procedimentos que se lhe sigam. Eu próprio reclamo que essas diligências tenham lugar e que se iniciem com a máxima brevidade. Nessa sequência fui abrangido no grupo de sacerdotes que, por causa disso, deixa o exercício público do ministério enquanto decorrerem as diligências processuais. Aceito-o com uma sensação dolorosa de enorme injustiça. (…) Sacrifico-me na esperança de poder estar a contribuir para o bem maior da Igreja.» São palavras à altura do carácter que lhe conheço. E, por isso, lhe exprimo com modéstia também a minha gratidão.
O facto de uma denúncia ser anónima não significa ipso facto que não possa ter sequência processual. A entidade que a valida e a aceita para investigação tem de ponderar o seu teor e eventuais elementos indiciários que a acompanhem. Tratando-se de crimes graves, pode considerar, por princípio, que, salvo inconsistência grosseira, é devido inquirir mais um pouco, em lugar de tudo descartar à partida em razão do anonimato. Ora, neste quadro de ponderação, só podemos opinar se a decisão foi bem ou mal tomada, se conhecermos a denúncia e o que a acompanhe, ou não. Como não o conheço, nada posso afirmar. Nesta altura, só posso dizer que não sei se a Comissão Independente agiu bem ou mal; sei que a diocese agiu bem; e sei também que o sacerdote visado pensa bem, apesar do natural sentimento de injustiça.
6. O essencial de tudo continua a ser as vítimas. Como já antes disse, a Igreja, as dioceses, as paróquias, é nessa direcção que têm de olhar. Os abusadores são a responsabilidade disciplinar. As vítimas é que são a responsabilidade pastoral. É preciso socorrer e apoiar aqueles que, num mau momento ou por má índole, servidores da Igreja molestaram, traindo a missão e a fé.
Nisso, tem toda a razão Laborinho Lúcio quando,
na mesma entrevista, disse: “as vítimas estão por detrás de nós e estão por detrás de tudo isto a assistir ao que está a acontecer.” E, recordando, o
Comunicado de 3 de Março, a Conferência Episcopal aponta bem: “Moveu-nos, desde o início, o desejo de ir ao encontro daqueles que foram vítimas desta situação dramática. (…) É também ao encontro das vítimas que queremos ir. É a elas que queremos continuar a dar voz para que o seu sofrimento não fique calado.” É por aí.
Para chegar às vítimas, solidarizando-se com a sua dor e construindo a reparação, em diálogo pessoal e directo, a Igreja pode puxar cada um dos fios que tenham consistência: de entre os fios dos alegados 98 abusadores, que não tenham sido já considerados sem fundamento; ou doutros fios dos 512 testemunhos validados pela Comissão Independente; ou das linhas que permitiram projectar 4815 possíveis vítimas. Não sei se será possível chegar a todas, ou se estas o quererão. Mas é nesse caminho que importa ir. Passo a passo, responder à dor, contruir a confiança. Não sei se serão mais ou menos que as 4815 da projecção. Mas é preciso chegar, pessoa a pessoa, a cada vítima real. Esta não é uma questão de estatística. Esta é uma questão de humanidade concreta.
A todos os envolvidos e partícipes, fica o apelo, o alerta, o aviso, a recomendação, a advertência: “Tende cuidado convosco!”
José Ribeiro e Castro
Advogado e cidadão
OBSERVADOR, 27.Março.2023
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