A mais velha Aliança
O Tratado de Londres de 1373, de que celebramos 650 anos, é o pilar de uma espantosa manifestação geopolítica de grande alcance. É formidável. Uso de propósito a palavra: geopolítica. Uma palavra que não existia na altura, final da Idade Média – nem o seu conceito, a simples ideia. E, no entanto, a Aliança Luso-Britânica é disso que se trata: pura geopolítica.
Basta olhar para o mapa para perceber de imediato a inteligência geopolítica da aliança. É apenas natural que um grande Reino, situado na maior ilha da Europa, no Noroeste do Continente, procurasse relações privilegiadas e uma aliança com outro Reino situado no extremo ocidental do Continente, na península mais a oeste da Europa – e vice-versa. O grande Reino insular nunca aspirou a ser um império europeu continental e foi, por vezes, a salvação do Reino peninsular contra ameaças, ataques e invasões de impérios continentais. E este Reino peninsular foi várias vezes um porto seguro para o grande Reino insular. Os dois reinos partilhavam uma riqueza para além da terra: o mar, o imenso mar oceânico, o poder da navegação.
A revelação começara dois séculos antes, no início do Reino de Portugal, em meados do século XII, no episódio marcante da conquista de Lisboa. E acentuou-se no Tratado de Windsor de 1386, seguido por factos excelentíssimos: o casamento de D. João I com D. Filipa de Lencastre e a geração que tiveram, que resultaria, entre outros feitos, no início dos Descobrimentos.
Hoje, quando olhamos para 650 anos atrás e vemos tudo o que esta aliança foi e é – "a mais antiga aliança diplomática ainda em vigor", como é costume dizer – não podemos ter a fantasia de imaginar que D. Fernando e Eduardo III ou D. João I e Ricardo II tiveram a visão de antecipar e adivinhar tudo o que viria a ser.
É evidente que não: os tratados foram ditados sobretudo por pragmatismo. Mas penso ter razão em pensar que também foram determinados pelo instinto; e que este instinto foi inspiração muito boa: um instinto geopolítico. É o que se vê melhor no Tratado de Windsor, que, à dimensão da paz, amizade e ajuda militar, acrescentou a liberdade de comércio e de trânsito no território da outra parte – uma cláusula de livre circulação que precede de muitos séculos o encontro de ambos os países na EFTA, na CEE e na UE.
Por isso, uma breve nota final, inspirada nestes 650 anos de Aliança Luso-Britânica. Tive pena do Brexit. Tenho saudades do Reino Unido na União Europeia. A UE não é a mesma sem os britânicos. Estamos um pouco sós. Anseio pelo dia em que, de novo juntos, partilhemos o mesmo projeto europeu. É a ordem natural da geopolítica.
José Ribeiro e Castro
Presidente da Sociedade Histórica da Independência de Portugal
BOLETIM DA SHIP, 30.Junho.2023
Editorial
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