A oportunidade continua aberta para a reforma eleitoral
O Manifesto lançado há uma semana pelo Paulo Trigo Pereira, de que sou um dos 25 subscritores, prova bem a ideia e o título deste artigo: a oportunidade continua aberta para a reforma eleitoral.
A reforma eleitoral, na verdade, não é tema esgotado, mas um tema da maior actualidade, como se verifica nas manifestações diversas que vão surgindo cada vez mais no espaço público. Os aparelhos dos partidos (nomeadamente, dos maiores) têm-se esforçado – com êxito – em bloquear iniciativas reformadoras, o que constitui a única explicação para, 27 anos depois (!) da revisão constitucional de 1997, as portas continuarem trancadas. Caso raro (senão único) no mundo, é espantoso como, em Portugal, o legislador constituinte teve grande sensibilidade e visão ao abrir portas a uma reforma democrática fundamental e, nove legislaturas depois (!), os poderes fácticos dentro dos maiores partidos continuam a impor a sua tacanhez e um conservadorismo de granito. Mas não conseguem calar a cidadania, que, desde o Manifesto por uma Democracia de Qualidade (em 2014) e a proposta de reforma que levámos à Assembleia da República em 2019, se vai manifestando cada vez mais e com maior variedade de abordagens no espaço público. Os sinais são claros: os cidadãos despertaram para a importância crucial desta reforma e não se calarão enquanto não lhes derem a democracia de qualidade a que têm direito, com representatividade, escrutínio, prestação de contas, proximidade e poder dos eleitores.
Este novo Manifesto, de 3 de Julho, tem o título “Reformar o Sistema Eleitoral: Renovar a Democracia”, assim assinalando que o nosso sistema eleitoral envelheceu precocemente, envelhecendo reflexamente a democracia – e que esta só pode ser renovada, refrescada, rejuvenescida, através da reforma eleitoral, libertando a democracia das amarras de captura que a abafam e restituindo-a à cidadania.
O Manifesto reafirma um dos maiores motivos de escândalo, que é preciso continuar a recordar e a repetir: «Portugal faz parte de um grupo muito reduzido de três países da União Europeia em que só é possível votar em listas partidárias (listas fechadas) nas eleições legislativas. Um pouco por todo o mundo, a maioria dos países democráticos que tem sistemas eleitorais proporcionais admite alguma forma de personalização do voto.»
Para a reforma necessária, aponta dois caminhos possíveis: «um sistema misto de representação proporcional personalizada em que cada eleitor tem dois votos, em que um é num partido e outro num candidato» (que continua a ser a minha escolha), ou um sistema «de voto preferencial em lista, em que o eleitor vota numa lista e pode votar também num(a) candidato(a)». Declara estar consciente de que «a reforma do sistema eleitoral, assegurando maior personalização dos mandatos e reduzindo o desperdício de votos, não é uma panaceia», mas insiste que «urge remover as barreiras e continuar o projeto inacabado de aperfeiçoamento da democracia portuguesa, começando pelo aperfeiçoamento tão necessário do nosso sistema eleitoral.»
Cita «a (longa) reflexão académica nacional» e lembra que, «devido à revisão Constitucional de 1997 – nomeadamente do artigo 149º, que abriu a porta à criação de círculos uninominais, a par de círculos plurinominais –, é atualmente possível caminhar para um sistema misto de representação proporcional personalizada», além de que, «em alternativa, continua a ser possível adotar o voto preferencial em lista». E aponta, assim, para dois propósitos principais – «dar maior liberdade de escolha aos eleitores e aproximar eleitores de eleitos» –, tudo traduzindo numa Iniciativa Legislativa de Cidadãos, que nos trouxesse ao “novo sistema eleitoral à Assembleia da República adaptado à realidade portuguesa do século XXI.”
E encerra com uma chamada de oportunidade, que também já tenho expresso noutros textos: «No simbólico ano que marca os 50 anos do 25 de Abril, apelamos à renovação do sistema eleitoral português através da participação e mobilização cidadã, tão essenciais na melhoria da qualidade da nossa democracia e na construção de consensos entre partidos políticos. É necessário reinventar a democracia que desejamos. É a hora de avançar!»
De facto, está na hora! A oportunidade continua aberta para a reforma eleitoral. A oportunidade só estará fechada quando for cumprida, pela aprovação do sistema eleitoral reformado que vá ao encontro das aspirações dos cidadãos e das necessidades da democracia.
Quem quer uma democracia cidadã, uma democracia enraizada, uma democracia representativa? Quem quer a democracia dos eleitores e não a dos chefes, chefinhos e chefões? Vamos a isso.
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