A guerra do Ultramar na história de Portugal – o legado dos combatentes
Este artigo é a adaptação do discurso feito pelo Presidente
da Sociedade Histórica da Independência de Portugal, José Ribeiro e Castro, no XXXI Encontro Nacional dos Combatentes do
Ultramar, Homenagem Nacional aos Combatentes 2024, no 10 de Junho de
2024, junto ao Monumento Nacional aos
Combatentes do Ultramar
Agradeço à organização esta distinção, esta oportunidade de ser o orador no 10 de Junho dos Combatentes da Guerra do Ultramar, na homenagem do Dia de Portugal e de Camões aos que combateram e deram a vida, no nosso tempo, na última guerra do Portugal Ultramarino, cinco séculos depois de o Portugal Ultramarino haver começado. E agradeço a todos que têm estado presentes todos os anos – uma vez mais neste XXXI Encontro Nacional –, o vosso exemplo, a vossa presença, o sinal luminoso da fidelidade patriótica que vivem e representam. Agradeço, reconhecido, a oportunidade de poder ser porta-voz dos portugueses que admiram e estimam os combatentes. Para mim, quer a título pessoal, quer como Presidente da Sociedade Histórica da Independência de Portugal, é uma honra impossível de pagar.
Registar ainda uma palavra especial ao General Joaquim Chito Rodrigues,
cidadão e militar de percurso exemplar, que, após longa e brilhante carreira no
Exército, com quatro comissões de serviço no Ultramar e várias funções de comando
e direcção em diferentes áreas, nacionais e internacionais, decidiu dedicar-se inteiramente
à Liga dos Combatentes, que lidera com brilho e distinção. É um gosto ter um general
como Chito Rodrigues, um orgulho ver uma instituição tão preciosa para a nossa
saúde colectiva e para a nossa memória colectiva como é a Liga dos Combatentes
entregue à liderança sábia, tenaz, de alguém com a sua inteligência, a sua
experiência, o seu coração e o seu patriotismo. Que Deus lhe dê muitos anos de
liderança à frente da Liga.
Gratidão aos
combatentes
Portugal ainda não agradeceu o suficiente àqueles que combateram por
Portugal e deram a vida pela Pátria – ainda que este Monumento e outros, mais modestos,
dispersos pelo país fora, sejam um sinal edificado desse preito. E também Portugal
ainda não agradeceu o suficiente àqueles que, desde há anos, organizam fielmente
esta homenagem no contexto do 10 de Junho.
Há poucos dias, 6 de Junho, decorreram numa praia da Normandia, no norte
de França, as cerimónias de evocação dos 80 Anos do Desembarque dos Aliados, o
chamado Dia D, um movimento militar heroico e poderoso que, com elevado preço
em vidas humanas, determinaria o fim mais rápido da 2.ª Grande Guerra e a
derrota dos nazis. Nessa cerimónia, há dias, além das figuras distintas, distinguiu-se
um simpático velhote, numa cadeira de rodas, às vezes sorridente, desdentado,
acompanhado (penso) por uma sua filha, que se sentava a seu lado. Veterano de
guerra, tinha umas palavras a dizer; e foi o actor britânico Martin Freeman que
leu a sua curta mensagem. Vale muito a pena procurar e ver esse pequeno
vídeo.
Percebemos, nessa altura, que era um soldado americano, chamado Joe Mines,
hoje com 99 anos de idade, isto é, tinha 19 anos, quando desembarcou naquela
praia, Gold Beach, em 1944. Diz que nunca aqui voltara em 80 anos e
pergunta-se por que razão voltaria agora. Evoca coisas terríveis que viu, como
um álbum de fotografias na cabeça, onde ainda visualiza tudo o que viveu. Conta
que desembarcara no sítio chamado Ver-sur-Mer e que os alemães recuaram,
permitindo que as tropas aliadas começassem a limpar minas na praia – a Gold
Beach. Fora esse o seu trabalho imediato e graceja com o seu próprio nome: “Joe
Mines clearing mines” – João Minas a limpar minas. Mesmo ao seu lado, viu um
camarada ficar sem uma perna por accionar uma mina. “A guerra é brutal”
- diz. Lembra outro soldado que conhecera no comboio quando se alistou e com
quem viera até à Normandia – morreu apenas uma hora depois do desembarque. Quanto
a si, teve sorte, muita sorte. Volta a perguntar: “Por que voltaria eu aqui?”
E responde:
“Well, this is the last and only opportunity for me, the last there will
ever be, and it's because of the lads. I want to pay my respects to those who
didn't make it. May they rest in peace!”
Bem, porque esta é a última e única
oportunidade para mim, a última que alguma vez haverá, e é por causa dos
rapazes. Eu quero apresentar os meus respeitos àqueles que não sobreviveram.
Que descansem em paz!
Todos os combatentes presentes neste Encontro Nacional do 10 de Junho estão
com o espírito, com o pensamento e com a alma focados nos camaradas de armas,
nos “rapazes”, e com as mesmas palavras de Joe Mines: apresentar os
respeitos àqueles que não sobreviveram e rezar por que descansem em paz. É o
código sagrado do combatente, essa palavra de honra, de básica humanidade do
combatente: ninguém fica para trás. E quando a sorte da guerra assim o ditou: nenhum
jamais é esquecido.
Os meus sentimentos e as minhas palavras são parecidos com os dos
combatentes, mas alguns degraus abaixo e expressos com humildade – não tive o
privilégio de ser combatente. Eu falo de fora e não de dentro. Não sou Joe
Mines, apenas posso manifestar gratidão. E faço-o. Faço-o quer aos que
perderam a vida, quer aos camaradas que os não esquecem, nem os deixam esquecer
e, como Joe Mines, são capazes de, mesmo à beira dos 100 anos, atravessar
um oceano inteiro apenas para os lembrar.
Ninguém fica para trás. Ninguém fica para trás. Ninguém fica para trás.
Nenhum é jamais esquecido. Nenhum é jamais esquecido.
Nenhum é jamais esquecido.
É altura para lembrar um herói
português falecido em Março passado, o Major piloto-aviador António Lobato, que
serviu a Força Aérea de 1957 a 1981. Capturado pelo inimigo, em Maio de 1963, na
Guiné, pouco depois de haver iniciado a comissão de serviço, seria levado para
Conacri, onde esteve sete anos e meio em cativeiro, sempre com comportamento
bravo e vertical. Daí seria resgatado com outros camaradas presos, em Novembro
de 1970, por uma das mais ousadas e brilhantes operações da história militar
portuguesa: a Operação Mar Verde. “Ninguém fica para trás.” Pouco depois
da morte do Major Lobato, cruzei-me por acaso, em Fronteira, no aniversário da
Batalha dos Atoleiros, em 6 de Abril, com um soldado português, capturado em
Outubro de 1968 e também libertado na mesma data, ele, ao fim de dois anos de
cativeiro em Conacri – empunhava um cartaz em que agradecia aos Heróis da Operação
Mar Verde. Lembro-o também aqui. “Nenhum é jamais esquecido.”
O mais belo Monumento
de Portugal
Este monumento é, há muito, na minha opinião, o Mais Belo Monumento de
Portugal. Não o digo só pela beleza escultórica e arquitectónica, com
simplicidade marcante, de grande poder simbólico, que nos empurra para cima e
para o Além e convida à oração; nem só pelo enquadramento magnífico com o Forte
do Bom Sucesso por detrás, o espelho de água que o rodeia e a envolvência, como
tinha de ser, desta área de Belém; mas é sobretudo, vindo de dentro e pairando
sobre o conjunto, o bem precioso que simboliza e guarda, que é de beleza
superior, extraordinária, na sua dimensão moral e projecção espiritual: a
dádiva integral de portugueses que se deram por Portugal.
Lemos detidamente, percorrendo o paredão – o lapidário –, os 9.274 nomes
que aí se encontram, desde o soldado Álvaro Henriques das Neves e o sub-chefe
da Polícia Aniceto Francisco do Rosário até ao tenente-coronel Rui Maggiolo
Gouveia e o major Alfredo Pereira Bastos. Logo percebemos, intuímos, que Luis
de Camões (o de hoje, 10 de Junho), se aqui tivesse estado, confirmaria estar
diante de bravos que andaram «em perigos e guerras esforçados» e bem
poderia ter-se inspirado neles – certamente noutros como eles – para escrever estes
seus versos lapidares:
«E aqueles que por
obras valerosas
Se vão da lei da
Morte libertando,»
O monumento imortaliza-os, na verdade. É diante deles que, pedindo
licença aos comandos que aqui estejam e autorização ao meu tio, tenente-coronel
Gilberto Santos e Castro, grito apenas:
Mama sume! Mama
sume! Mama sume! Aqui estamos.
Ao ler alguma documentação, para me preparar para este acto de homenagem,
li que ainda faltaria inscrever no paredão alguns nomes, certamente apenas conhecidos
depois da última gravação. Não sei se é assim, ou não, e se a informação que li
não terá sido, entretanto, actualizada. Mas, se assim for, se algum nome faltar,
temos de juntar esforços para fazer o Estado executar a necessária actualização
do Lapidário. “Nenhum é jamais esquecido. Nenhum
é jamais esquecido. Nenhum é jamais esquecido.” Nada pode falhar ao
carácter também pessoal deste monumento, que honra e serve também as viúvas, os
filhos e os netos dos que morreram por Portugal.
Soube também, por essas leituras, que não há nenhum memorial específico
que evoque aqueles militares africanos recrutados localmente, que, nas nossas
Forças Armadas, serviram lealmente – às vezes heroicamente – a nossa bandeira e
que, em lugar de os protegermos e lhes garantirmos a segurança na hora da transição
política, os despojámos, primeiro, da nacionalidade portuguesa e os entregámos,
depois, ao antigo inimigo. Li a lista extensa e numerosa dos que, na Guiné,
foram fuzilados pelas tropas do PAIGC por causa disto. Creio haver outros casos
em Moçambique e não sei se noutros lugares. Embora sejam diferentes as
circunstâncias da sua morte, Portugal tem a obrigação de recolher os seus nomes
e os registar também aqui em memorial condigno. Serviram a mesma Pátria, no
mesmo Exército, com a mesma bandeira, a mesma bravura, a mesma entrega, o mesmo
patriotismo. Houve os que, agindo por nós, traíram o compromisso sagrado do
combatente, entregando-os a eles à morte e a nós todos à vergonha. É nosso o direito
sagrado, que é também um dever, de honrar os nossos mortos. Temos de os resgatar,
um por um, pelo seu nome, pela sua honra, pela sua memória, cumprindo o
compromisso que é o nosso dever português: “Ninguém fica para trás. Ninguém
fica para trás. Ninguém fica para trás.”
Todos os combatentes
dão a vida
Este monumento não é apenas àqueles que perderam a vida, mas a todos os Combatentes
do Ultramar. Em verdade, todos os combatentes dão igualmente a sua vida, quando
vão para uma guerra. Se a trazem, ou não, a vida de volta, depende quantas
vezes de acasos. O que teve Joe Mines de diferente do camarada que, ao seu
lado, perdeu logo uma perna, rebentada por uma mina? O que teve Joe Mines
de diferente do seu companheiro de alistamento, que não sobreviveu mais de uma
hora à brutalidade do desembarque? Nada, todos os três passaram o mesmo. Mas só
Joe Mines regressou vivo e com as duas pernas. Porquê? Ele disse-o:
sorte! “Tive muita, muita sorte!”
Devemos o mesmo a todos os antigos combatentes, aos veteranos. Não são
mais, nem menos por estarem vivos. Fora talentos ou feitos específicos, de grande
bravura, formidável capacidade combativa, abnegação extraordinária, excepcional
liderança sagacidade estratégica, aguda inteligência militar, que sempre
importa conhecer, reconhecer e exaltar, todos os combatentes merecem a mesma
gratidão e comum admiração.
Este monumento representa a homenagem nacional a todos os portugueses –
jovens – que, num determinado período da vida nacional, deram a vida, a
dedicação e a entrega total a Portugal, que lhes pedia esse serviço integral
para defesa do Portugal Ultramarino e de Portugal no seu conjunto.
Vem na linha de uma longa saga de nove séculos: a saga da nossa longa
existência como nação livre e independente. Começámos exactamente por uma
batalha, em que o nosso futuro primeiro Rei resgatou, para si, directamente, o
governo do condado que haveria de ser o Reino de Portugal. Foi a Batalha de São
Mamede, em 1128 – faz 900 anos já daqui a quatro anos. A seguir, outra grande
batalha, em Ourique, no ano de 1139, onde vencemos cinco reis mouros,
granjeando para o nosso Rei grande prestígio entre os reinos cristãos da
Europa. Foram estas duas batalhas, travadas por combatentes como os que aqui se
encontram nesta homenagem, que consolidaram o poder e o terreno indispensáveis
a que a política e a diplomacia pudessem avançar. Por isso, Portugal pôde ser reconhecido
como Reino autónomo, em 1143, e consagrado como plenamente independente, em
1179. Foi o eco político-diplomático dos triunfos dos combatentes, sob o
comando ousado e determinado de D. Afonso Henriques, tanto naquelas batalhas de
S. Mamede e Ourique, como nas várias conquistas que, depois de 1139, foram sempre
fazendo a sul de Coimbra, primeiro, e a sul do Tejo, depois.
Após o ciclo da fundação de Portugal, os combatentes voltaram a ser protagonistas
decisivos da nossa história, nos períodos mais marcantes ou críticos: a Guerra da
Independência, em 1383/85; as conquistas no Norte de África e, depois, no
Oriente, em África e no Brasil; as batalhas da Restauração, na Península, para
afastar Castela e, no Ultramar, para reaver possessões que franceses e
holandeses haviam ocupado; a longa e dura Guerra Peninsular, com as três
terríveis invasões francesas; a nossa participação, em solo francês, na 1.ª Guerra
Mundial.
A guerra do Ultramar
A guerra do Ultramar está na linha destas grandes campanhas militares nacionais.
Há um fio directo que vem de 1128, passa por Aljubarrota, em 1385, pela
Restauração de 1640-1668, pela batalha de La Lys, em 1918, até à missão de
assegurar a defesa, a integridade territorial e a soberania nos territórios
ultramarinos portugueses, nos anos 60 e 70. Esse fio é cumprir as missões de
soberania, sob determinação do poder legítimo que interpreta a ideia de
Portugal.
A guerra do Ultramar situou-se ainda na linha específica das campanhas
ultramarinas que se iniciaram com a conquista de Ceuta, em 1415. Houve
diferentes momentos e etapas, e diferentes contextos e territórios. Houve
momentos heroicos e êxitos improváveis, como a batalha de Macau, em 1622, que parou
e expulsou os holandeses. Houve novidades promissoras, como a reconquista de
Angola e São Tomé aos holandeses, em 1648, por forças luso-brasileiras reunidas
pelo comando de Salvador Correia de Sá. Houve grandes desastres, como
Alcácer-Quibir, em 1578, e, a seguir ao êxito de Ceuta, o desastre de Tânger, em
1437, de que resultou a tragédia do Infante Santo, cativo em Fez, onde morreu em
1443. Aqui, o fio condutor é mais fácil de definir: num primeiro tempo,
conquistar; noutro tempo, reconquistar ou defender.
Às vezes, discute-se se esta ou aquela campanha foram boas escolhas, o que
é sempre meramente especulativo: boa conversa, má história. À história interessa
aquilo que foi, como foi e por que foi. No caso da guerra do Ultramar, foi
decidida pelas autoridades do tempo, para defender na nossa soberania as populações
e os territórios, na linha de entendimento dos interesses nacionais que vinha definido
desde sempre e, mais recentemente, desde os finais da Monarquia e desde a 1.ª
República. Os combatentes fizeram aquilo que Portugal pediu, talvez mesmo mais
do que lhes fora pedido.
Com a revolução, a política do país mudou totalmente; e os territórios
ultramarinos, com guerra ou sem guerra, seguiram caminho próprio, independente.
Foi tudo num ápice, antes mesmo de a nova Constituição ser aprovada e entrar em
vigor. Este novo caminho foi decidido pelas autoridades revolucionárias.
Poderá perguntar-se: a guerra tinha sido perdida? O esforço militar e
combativo foi inútil? As vidas perdidas foram em vão? Não, nada disso. A guerra
do Ultramar não tinha sido perdida em nenhum dos três teatros operacionais; e
estava mais ganha que perdida em dois deles, num claramente ganha. As Forças Armadas, com todos os seus combatentes, tinham
cumprido devotadamente a missão e mantinham a Nação em plenas condições de
poder decidir livremente a sua política ultramarina. Deixando de parte os episódios
deploráveis próprios do ambiente revolucionário, as Forças Armadas, olhando
para trás, puderam sair, com honra histórica, desses territórios, cujas
populações serviam para as proteger e as defender. As Forças Armadas não foram
derrotadas; mantiveram e mantêm, por isso, grande autoridade e prestígio para
poderem continuar a servir, através da cooperação militar, os novos países
independentes e os seus povos, no quadro dos melhores interesses mútuos e das
solicitações que nos sejam feitas.
As guerras não são bonitas, como dizia Joe Mines na Gold Beach.
E a guerra do Ultramar teve momentos muitos difíceis, quadros muito dolorosos. Importa
lembrar que uma das razões por que Portugal sustentava dever manter aquele
esforço militar era considerar que, por causa das populações, lhe cabia impedir,
em toda a extensão ao seu alcance, que a “guerra fria” desabasse com todo o
fragor sobre os três territórios em guerra e, sobretudo, Angola e Moçambique. O
tempo passado mostra-nos o que se passou na Guiné, em Moçambique e em Angola.
Em Moçambique, a guerra civil durou de 1976 a 1992, com níveis de violência
muito acentuados e até grande crueldade. Em Angola, a guerra civil foi pior,
durando de 1975 a 2002, com destruição generalizada e violentíssima e
envolvimento da aviação de combate e blindados pesados, numa escalada militar que
nunca se vira em África, senão em campanhas da 2.ª guerra mundial, provocando
um milhão de mortos, um ror de feridos e estropeados, milhões de deslocados e refugiados.
Uma enorme tragédia humanitária pela confrontação dos dois grandes blocos e das
superpotências, a cair sobre aqueles países. A guerra fria tornou-se muito
quente.
Olhar ao futuro
O nosso esforço não é menos louvável, porque os outros não aproveitaram aquilo
que conseguimos para que eles decidissem bem. Podemos ficar tristes. É normal que
nos entristeça vermos consequências tão pesadas de decisões tão erradas ou
factos tão calamitosos. Mas nunca podemos pôr em dúvida o mérito do nosso
esforço e a razão de ser, a utilidade do nosso sacrifício, a coragem, a
verticalidade e a honra de termos dado o corpo ao manifesto. Aqueles que deram de
si tudo quanto lhes foi pedido e que não tomaram nenhuma das decisões erradas
que aconteceram, são credores, na mesma, do nosso reconhecimento e vêem
engrandecer-se, no plano histórico, o mérito do que fizeram de positivo e do
que deram em generosidade total.
Não olho para trás com ponta de saudosismo. Olho com esperança para o
futuro dos novos países de língua portuguesa; sigo com atenção e proximidade os
seus desenvolvimentos; desejo que acertem sempre e que progridam sempre mais
além; anseio que as nossas relações de cooperação sejam de cooperação e amizade
e cada vez mais estreitas, intensas, genuínas, fortes e dinâmicas; torço pelos
seus êxitos, não só no desporto, mas em domínios muito mais importantes como a
educação, a saúde, a economia, a ciência; quero muito que todos estes países
aproveitem, neste século, as oportunidades extraordinárias que as estatísticas
demográficas prenunciam; quero que sejam democracias estáveis e abertas,
verdadeiras, onde o Estado de direito seja uma garantia para todos e as
liberdades fundamentais estejam asseguradas; espero que produzam muito, que
sejam prósperos, que combatam a corrupção e que distribuam muito bem a sua
riqueza para chegar a todos, isto é, desejo que tenham progresso, crescimento e
desenvolvimento. Quero que cumpram as esperanças e os sonhos das suas independências
nacionais – consigo senti-los como sendo meus sonhos também. Às vezes,
parece-me fácil: bastaria que todos seguissem o modelo de Cabo Verde. Faço
parte daqueles que estão sempre prontos a ajudar perante qualquer pedido dos
países de língua portuguesa. E, se aqueles que são independentes há menos
tempo, alcançarem e fizerem melhor do que no tempo da administração portuguesa,
ficarei contente com isso e, podendo, ajudarei a que avancem até mais longe e mais
depressa. O progresso é o normal – e, habitualmente, também vem com o tempo.
Quero uma comunidade muito forte de língua portuguesa, em que todos nos demos
bem, todos cooperemos de modo intenso e aberto e todos possamos orgulhar-nos de
todos.
O essencial é que, para além das vicissitudes da história, mantenhamos
entre todos a proximidade dos laços comuns e saibamos cultivar e frutificar as
relações de cumplicidade que a história e as culturas definiram. Como se diz em
Angola, estamos juntos!
Os combatentes da Guerra do Ultramar também teceram muitos dos fios desta
relação, muitos porque criaram laços de afecto com essas terras e as suas
populações, que perduram até hoje; e todos porque têm nobreza de carácter e
sabem que a “paz dos bravos” é a que é mais sólida e fecunda, porque assenta na
mesma experiência em lados opostos e no efectivo respeito mútuo. É uma paz que
é selada cara a cara, olhos nos olhos. E, uma vez feita, nunca é desfeita.
Após a guerra, vem sempre a paz, que havemos de servir ainda melhor, com
o coração tranquilo, a memória limpa, o dever cumprido. E a camaradagem sempre.
Ninguém fica para trás! Nenhum é jamais esquecido!
XXXI ENCONTRO NACIONAL
HOMENAGEM NACIONAL
AOS COMBATENTES 2024
10 de Junho de 2024
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